Já com um percurso considerável no cinema, Yann Gozlan regressa às salas de cinema no dia 16 de setembro com um thriller impressionante na sua eficiência. 

Yann Gozlan

Com o nome “Caixa Negra”, este declarado fã de Milos Forman e Alfred Hitchcock, que  começou nas longas-metragens com o filme de terror “Captives”, leva-nos agora até ao mundo sombrio e extremamente competitivo da aeronáutica, onde os altos valores monetários envolvidos e à automatização dos aviões coloca em cena questões importantes na relação homens/máquinas e nos jogos de poder entre grandes empresas e o próprio estado. 

O foco do filme é um acidente aéreo e a sua investigação, estando em particular destaque Mathieu (Pierre Niney), o homem por trás da análise à caixa negra de um avião cuja queda pode não ter sido acidental. Com um verdadeiro toque hitchcockiano e um suspense aguerrido que prende o espectador à sua cadeira do início ao fim, Gozlan explora o seu fascínio ao longo da vida pela aeronáutica e aviação civil, uma arena povoada por fabricantes, pilotos, investigadores e outros jogadores com muitos interesses às vezes divergentes. “Gosto de filmar o que me inquieta. Sou fascinado por toda a tecnologia, mas assusta-me o facto de tudo nela poder derrapar para algo mau”, disse-nos o cineasta em janeiro passado, acrescentando que para criar o seu filme de suspense foram necessários dois grande movimentos: levar o espectador a criar empatia com a personagem do investigador, mas simultaneamente colocá-lo em causa devido às suas teorias começarem a ser apenas um reflexo da obsessão e paranóia. “Sim, a paranóia e a obsessão são coisas que me atraem. Gosto muito de personagens presas dentro de uma espiral interna de conflitos, que se debatem constantemente. Pessoas que querem controlar as coisas, mas são ultrapassadas pelas suas próprias obsessões, perdendo totalmente o controlo da situação. Pessoas que se perdem numa demanda cega pela verdade e põem em risco a sua relação com os outros, incluindo com a sua esposa”. 

Pierre Niney e o veterano André Dussollier

Paranóia  e o sentimento de conspiração não faltam em “Caixa Negra”, especialmente em torno da personagem de Mathieu, que representou uma nova colaboração do realizador com o ator Pierre Niney: “Depois de trabalhar com ele em “Un homme idéal” fiquei muito fascinado pelo seu profissionalismo e método. Por isso, quando escrevi o guião com os meus coargumentistas tinha-o na mente para aquele papel. Se ele recusasse participar no filme, seria complicado. Na minha mente ele era o Mathieu e tinha tudo o que havia de essencial para encarnar aquela vida interior problemática da personagem, uma febrilidade e nervosismo. Queria alguém que mostrasse sentimentos que necessariamente não passavam pelos diálogos, elementos que ele transmite naturalmente pela sua expressividade e presença em cena”.

A acompanhar no elenco Niney temos o veterano André Dussollier, “um verdadeiro camaleão” para Yann Gozlan, já que navega facilmente entre géneros cinematográficos e consegue sempre impor-se, não interessa com quem divide o ecrã: “Aqui sabia que precisava de alguém que impõe uma verdadeira autoridade, mas que simultaneamente desse também um toque paternal, quase afetivo, para com a personagem do Niney, a qual, arrastando-se entre microdetalhes, perde-se no meio da investigação. 

Estética cuidada e atmosfera tensa

Para construir a atmosfera do filme, sempre carregada de incerteza, Gozlan não se socorreu apenas dos textos ou da prestação dos atores. Todo o filme carrega em si uma força estética metalizada, fazendo contrastar sobremaneira os espaços ligados à aeronáutica – estéreis, quase que desumanizados – dos mais íntimos, como a casa do protagonista.  “Quis essa estética metálica como diz. Todos os decors eram muito importantes para mim e foram criteriosamente pensados; o filmar naqueles aeroportos, naqueles espaços sem vida. Queria esse ambiente nas zonas de trabalho, em oposição aos espaços ligados à vida pessoal das personagens, e queria que isso se sentisse orgânico. (…) Há também, permanentemente, um tom imersivo e sensorial que queria incutir no filme e vemos isso logo na primeira cena, através de um plano sequência sobre um avião. E essa força sensorial é extremamente mais explícita e sente-se melhor numa sala de cinema”.