Sendo um oposto espiritual ao tão bem sucedido (e enjoativo na sua demonstração) “A Queda de Wall Street“, “A Lei do Mercado” fala-nos do “proletariado” que efetivamente sofreu os efeitos da crise internacional de 2008.
Neste filme, a montagem bonitinha é mínima. O objetivo é ser o mais naturalista possível, e fora o excelente Vincent Lindon (prémio merecídissimo em Cannes e nos Cesar para Melhor Ator), todos os restantes atores são meros desconhecidos.
Ao longo de uma série de longos planos, acompanhamos o que acontece a um desempregado de 51 anos, passando por várias etapas do seu dia a dia: das suas visitas ao banco e ao centro de emprego à sua vida familiar (nomeadamente com a sua mulher e o seu filho deficiente), passando por entrevistas verdadeiramente confrangedoras – uma via skype, outra presencial em grupo, até ao momento de quebra final, onde o protagonista e o espectador ficam ambos fartos da situação que assistem.
Não é um mecanismo propriamente inovador, mesmo dentro do cinema francófono, um cinema com um forte historial do chamado “realismo social“. Nas últimas décadas, o ponto de referência mais óbvio é o cinema dos irmãos Dardenne que fartou-se de mostrar (e fartou-me eventualmente com) esta mecânica de “realismo social“. Ainda assim, o filme de Stéphane Brizé funciona bem como reflexo dos tempos modernos, pois evita o panfletismo extremista e a exploração da desgraça alheia.
E porque sim, Lindon, enigmático mas capaz de comunicar com o público todas as suas “expressões faciais” e “linguagem corporal” (aproveitando para referenciar o que acontece ali a meio num dos momentos mais desconcertantes e capazes de gerar alguns dos muitos risos nervosos gerados aqui), está lá para aguentar todos os golpes até não dar mais, e para nos fazer cúmplices nesta trama, e consequentemente cúmplices de toda a situação atual mercantil, enquanto meros empregados da máquina.
É esta atualidade e universalidade da história, aliada a uma das performances mais marcantes do ano, que tornam “A Lei do Mercado” tão difícil de dispensar.
O melhor: Vincent Lindon e a atualidade e universalidade da história
O pior: esta recusa da montagem cinematográfica, “irrealista”, na colagem das suas peças individualmente fortes, torna o filme um pouco pesado, e a um golpe ou dois do verdadeiro K.O.
André Gonçalves