Há qualquer coisa de estranho em Davide (Davide Capone). Ele é um rapaz, mas não se sente como tal. A sua particularidade é vista com um afeto consolador da parte da mãe, que sofre de uma doença óptica regressiva, mas com uma violenta reprovação pelo pai, o que leva o jovem de 14 anos a abandonar a família e a viver à sua mercê nas ruas do bairro San Berillo. Aqui, Davide encontrará uma família adoptiva, um grupo diversificado de homossexuais, transexuais e outros que partilham, com o nosso protagonista, o orgulho pela diferença e o repúdio pela padronização social.

A primeira obra de Sebastiano Riso poderá ser vista como um exemplo mais que modelizado do universo queer, onde até mesmo o seu desfecho nos remete à dor existencial deste tipo de cinema. Porém, Più Buio di Mezzanotte tem como minuciosidade o tratamento da classe homossexual e transgénero como se de criaturas alienadas se tratassem, viventes e falsamente livres na escuridão da noite. Em termos referenciais, diríamos que este leque de personagens excêntricos e de carácter bizarro são vistos como uma espécie de vampiros transvestidos saídos de uma obra mui generis da expressiva e explosiva década de 70, como também são evidentes claras influências ao cinema de Walter Hill, nomeadamente The Warriors (1979), em que é possível testemunhar as abordagens quase tribais.

É um retrato de uma homossexualidade confundida com contra-cultura, que ocasionalmente encontra a estranha beleza nas suas imagens, entre as quais um primeiro choque para com o bairro San Berillo, com o espectador a ser guiado por um plano sequência frontal e sob um rígido carácter etnográfico. Todavia, Più Buio di Mezzanotte pode muito deter um estética válida, mas é carente em emoção e um dos factores que se destaca é a unidimensionalidade das personagens secundárias e um cenário demasiado “pastiche”. Infelizmente, são várias as oportunidades que Sebastiano Riso tem de implantar uma marca pessoal neste enredo demasiado frigido e cumpridor dos códigos do cinema que deseja pertencer.

A sensação final, e embora não seja de um total desperdício, é que estamos perante uma pequena desilusão, especialmente  tendo em conta as cartas jogadas. Sob uma esforçada linguagem cinematográfica e no descodificar do erotismo na homossexualidade, Più Buio di Mezzanotte é como aquelas crianças mal comportadas, que afinal são tudo menos irreverentes.

Pontuação Geral
Hugo Gomes
piu-buio-di-mezzanotte-por-hugo-gomesFilme que fantasia ser queer e que só encontra formatos