Sexta-feira, 19 Abril

«Flor Azul» por João Miranda

Flor Azul é a primeira obra de Raul Domingues, um estudante da Escola Superior de Artes e Design das Caldas da Rainha. E vê-se. Quer dizer, este é um filme amador em todos os seus elementos: a câmara que não pára de tremer, os enquadramentos tortos, a pouca preocupação com a luz e a edição incoerente. Mas não é isso o pior de Flor Azul. O pior é mesmo a falta de tema. Se há filmes que se dedicam a explorar emoções ou um conceito ou mesmo o próprio cinema, este fica-se por uma espécie de diário da vida do campo, com episódios típicos (colheita, queimada, a apanha da azeitona, etc.) entrecortados com experiências do realizador (gatos a brincar, uma nuvem que esconde o sol, filmar o sol enquanto guia e outras semelhantes). Aliás, poder-se-ia dizer que todas as experiências típicas que se fazem nos primeiros meses depois de se ter uma câmara se encontram aqui. Todas.

Para piorar ainda mais as coisas, este filme foi antecedido de uma curta – Metáfora ou A Tristeza Virada do Avesso de Catarina Vasconcelos – onde as preocupações estéticas e temáticas eram exploradas com cuidado. O contraste matou qualquer boa vontade que pudesse haver para esta primeira obra: desde o final do primeiro filme até ao final da sessão nunca pararam de sair pessoas. Se as primeiras, que saíram logo no final do primeiro filme, ainda podiam ter sido censuradas por nem terem dado uma oportunidade e não mostrarem qualquer respeito para com o filme que vinha a seguir, todas as outras são compreensíveis. Tenho de admitir que a única coisa que me manteve na sala até ao final foi a ideia que se tratava de um filme que tinha sido escolhido para a competição nacional do festival e, como tal, algo teria que o justificasse, um qualquer fim redentor, uma ideia que tornaria clara e justificável o resto do tormento. Nada. A coisa correu tão mal que até uma pessoa de muletas preferiu arriscar partir outra perna a descer as escadas da Sala Manoel de Oliveira às escuras a aguentar mais cinco minutos do filme.

Podemos argumentar que se trata de um momento complicado do cinema português e que a falta de oferta faz com que, para se ter uma competição nacional, se tenha de baixar os padrões e apresentar algo, nem que que seja para mostrar que este ainda vive, mas, num ano em que as nossas salas tiveram filmes como Os Maias ou Alentejo, Alentejo, essa desculpa não parece funcionar. Se há mérito, é a vontade de Raul Domingues de filmar e se dedicar à criação de um filme. Pena que o filme em si não seja bom. O Youtube está cheio de produções amadoras com mais qualidade.

O Melhor: A curta que o antecedeu.
O Pior: Um filme amador.


João Miranda

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