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Um assassino na 3ª Idade: uma conversa com os responsáveis por «Comeback»

 

Esta história de um assassino a soldo em decadência foi escolhido pelo Júri da Crítica como o Melhor Filme do FESTin (edição terminada na última quarta-feira), distinção acompanhada de outra, atribuída pelo Júri Oficial, de Melhor Realizador para Érico Rassi.

O C7nema conversou com ele e a produtora Cristiane Miotto, antes da divulgação dos prémios ocorridas, sobre como este pequeno projeto tem-se tornado numa agradável surpresa nos festivais enquanto aguarda o seu lançamento comercial no Brasil, em maio.

Comeback é uma obra melancólica, cadenciada, que mergulha no interior do estado brasileiro de Goiás para acompanhar Amador (Nélson Xavier, magnífico, como sempre), um ex-assassino agora empurrado para a reforma e para a inutilidade.

ATO DE MATAR

Como pano de fundo, o enredo adentra de forma algo desinteressada pelas pequenas máfias ligadas a máquinas de caça-níqueis no Brasil profundo. Mais do que o crime, o verdadeiro tema do filme é o envelhecimento – cujos signos são distribuídos aqui e ali com traços de irónica nostalgia – como a pistola do assassino que precisa de ser sacudida para funcionar, ou o álbum onde ele coleciona os seus “grandes feitos” – execuções, chacinas, massacres dos quais se orgulha.

A situação traz algo de surreal, algo como alguém falar em assassinato como se falasse de uma ida ao cinema. “A profissão dele aqui é como outra qualquer“, observa Miotto. “A verdadeira pesquisa que fizemos para o filme não foi em torno disto, mas antes da terceira idade. Entrevistamos muitos idosos, frequentamos locais semelhantes aos que aparecem no filme. Depois trouxemos para a história o universo da velhice, com a sua melancolia e solidão“.

CENTRO-OESTE

A ida para Anápolis, cidade de cerca de 400 mil habitantes no Centro-Oeste brasileiro, concedeu ao filme mais um elemento para retratar um universo declínio – trazendo uma paisagem muito diferente das grandes cidades e o seu movimento constante. Como sublinha Rassi, “quando pensamos na periferia carioca, lembramos de algo caótico e movimentado. Eu queria uma periferia onde nada acontecesse“.

ENCANTAMENTOS

O filme deixa atrás de si uma longa trajetória de encantamento. Tudo começou no Festival do Rio, habitualmente um dos mais importantes panoramas do cinema brasileiro contemporâneo. “Nunca pensei que eles iriam nos aceitar“, diz a produtora, consciente das pequenas dimensões do projeto.

E se apenas isso já foi uma grande vitória, o restante foi ainda melhor: “Temos recebido tantas críticas positivas que vou estranhar quando isso não acontecer“, sublinha Érico, sem qualquer sombra de vaidade.

O ASSASSINO

O ator Nelson Xavier é um dos gigantes do cinema brasileiro recente (veja-se obras como A Despedida) e certamente parte desta aposta ganha vem do seu talento e carisma. “Nós enviamos o projeto para ele…“, conta Rassi, “… e apenas dois dias depois ele respondeu, dizendo que estava muito interessado“. “Não tínhamos dinheiro…“, completa Miotto, “…então nem sequer podíamos viajar de avião de São Paulo para o Rio de Janeiro. Para conversar com ele tivemos que ir de autocarro!” (risos). As sete horas de trajeto tornaram-se uma constante: enquanto discutiam os detalhes, as madrugadas passadas em trânsito iram tornar-se uma constante.

Xavier, que andava a participar de uma telenovela, terminou por aceitar o pedido mais difícil da dupla: mudar-se durante 40 dias para Anápolis, cidade a cerca de 1300 quilómetros de distância do Rio. “Quando ele pegou o plano de filmagem disse que tínhamos ficado malucos!” (risos). “Mas o problema é que ele aparecia em todas as cenas“, observou a produtora.

CENTRO WESTERN…

Érico Rassi já encontrou outra história para contar: Oeste Outra Vez, em fase de captação de recursos, será uma espécie de western na mesma região do Brasil onde passou-se a ação de Comeback.