Sexta-feira, 19 Abril

Entrevista a James Gray, o realizador de «A Emigrante»

«Magoam-me bastante as críticas negativas»

Depois das emoções à flor da pele, sempre com A Grande Maçã em pano de fundo, vividas em Duplo Amor, James Gray regressa a casa em A Emigrante para evocar as suas próprias raízes, durante o período de grande emigração americana imediatamente após a Primeira Guerra Mundial, no que pretende ser encarado como um fresco nostálgico transbordante de emoções. À partida com tudo para dar certo: um Joaquin Phoenix desejavelmente em forma após a bizarra operação ‘hip-hop’, de resto comprovado pela entrega em The Master – O Mentor; a par de uma Marion Cotillard a quem nos habituámos a total rendição. Mal fora anunciado na secção competitiva de Cannes 2013, tomámo-lo como o nosso “cavalo de corrida” para a Palma de Ouro.

Pena é que após o visionamento a expetativa tenha dado lugar a uma semi-desilusão. Ficámos com a ideia que Gray terá investido tempo demais no rigor plástico da reconstituição de época – irrepreensível, de facto, graças ao trabalho do DP Darius Khondji – descurando uma solidez dramática que nunca parece encontrar-se verdadeiramente. Normalmente, numa entrevista abstemo-nos de juízos de valor sobre o filme ou as suas circunstâncias. Mas nada deve estar gravado na pedra, certo? Foi, assim, com um amargo de boca, e alguma irritação, que enfrentámos o realizador de 44 anos num hotel de Cannes. A conversa num grupo de jornalistas relativamente homogéneo nem correu mal…

Sente que o resultado final deste filme corresponde à visão inicial da sua história?

Colocaria a questão de uma outra forma. Até porque acredito cada vez menos nessa ‘visão’ e muito mais naquilo que os meus colaboradores podem fazer para me ajudar. É nesse processo de colaboração que acredito.

Seja como for este é um filme apoiado numa história forte. Onde colheu a ideia original?

Existem vários factos que acumulei ao longo dos tempos que me conduzem a esta história. Como o facto da minha avó não saber como comer uma banana ou lembrar-me de ouvir o meu avô dizer que conhecera pessoas que haviam sido separadas à chegada a Ellis Island. No entanto, isso funcionou apenas como um veículo para poder explorar emoções humanas. É essa ligação emocional ao tema que me conduziu à história. O filme foi concebido pelo final recuando para trás, com este homem (Joaquin Phoenix) a dizer à mulher que explorou (Marion Cotillard) que é um inútil e ela a perdoar-lhe.

Como foi para si escrever a história do ponto de vista feminino?

Para mim foi fácil porque não pensei que fosse mulher ou homem, apenas pensei o que faria uma pessoa naquela situação. Nunca pensei o que faria uma mulher naquela situação. Talvez tenha pensado mais em mim… Pelo menos, tentei não me comprometer.

Neste regresso a Nova Iorque no início do século imagino que está presente também uma homenagem à sua família de emigrantes russos?

Claro. O complicado de fazer um filme de época sobre Nova Iorque – especialmente este período, quando os meus avós chegaram – é que não funciona como uma máquina no tempo. Mas pagámos quase um milhão de dólares por reconstituir à época uma das ruas onde passam Marion e o Joaquin.

Acho que é inevitável recordar Era Uma Vez na América ou O Padrinho II. E, seguramente, um trabalho notável do Darius Khondji…

Na verdade não é possível evitar comparações. Eles fizeram um trabalho admirável. O trabalho do Gordon Willis é igual às fotografias de época. Nesse sentido, evitar isso seria seguir tornar o filme menos rigoroso. O que eles fizeram, fizeram bem. O que tentei foi esquecer esses filmes e apostar fundamentalmente em dois elementos. Water chromes, um processo fotográfico desse período composto por placas de vidro em que eram moldados os níveis de vermelho, verde e azul para lhe dar um falso ar de tempo. Eu e o Darius pensámos como seria possível roubar esse look para o filme. O outro elementos que usamos foram trabalhos de vários artistas que pintaram Nova Iorque nesta altura. No fundo usámos uma fusão destes dois processos.

Neste regresso ao passado entende que existe aqui algum processo de regeneração ou síntese do seu trabalho, quem sabe para começar a fazer algo de novo?

É uma ótima pergunta, mas não faço ideia. Isto porque não tenho qualquer pleno da indústria de cinema. Tal como não sei o que vou fazer a seguir. Tento concretizar aquilo que me emociona. E da melhor forma. Eu então não o faço. O que lhe posso dizer é que não quero fazer sempre o mesmo filme. Talvez saiba quando fizer outro filme.

Falemos então dos atores. A Marion está fantástica e o Joaquin tem o seu papel depois de The Master, que é completamente diferente. Como foi para si regressar ao trabalho com ele?

Adoro-o. É um tipo louco, é claro. Trabalha imenso. O que é interessante é que ele pensa em tudo aquilo que faz, não faz nada por acaso. Apesar de adorar improvisação. A Marion é um pouco diferente. Claro que pode improvisar, mas é muito estruturada na forma como trabalha. Mas é capaz de seguir, tal como o Joaquin, numa procura. Já o Jeremy (Renner) é muito mais específico. Sabe exatamente o que quer e tenta perceber como a personagem se relaciona como ele próprio.

Manteve o contacto com o Joaquim após Amor Duplo?

Muito pouco. É claro que teve aquele momento de loucura na promoção no programa do David Letterman… O filme até foi bem recebido, mas esse episódio foi bastante mau. Fiquei mesmo um pouco magoado com ele durante algum tempo. Depois perdoei-lhe.

Como é que o James reage a críticas menos boas? É verdade que as teve. Costuma lê-las?

Por vezes leio. E magoam-me bastante as críticas negativas. Oxalá tivesse a mentir a dizer que não quero saber. Não me preocupa tanto o ponto de vista crítico, mas se as pessoas não gostam. No entanto, tenho algo bom, pois nada disso me afasta do trabalho que faço a seguir.

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