Sexta-feira, 19 Abril

«Dumplin’» (Miss XL) por Guilherme F. Alcobia

 
O espectador de Dumplin’ verá um filme com uma estrutura formulaica e convencional. Verá um filme que tenta a todo o custo extrair-lhe lágrimas e sorrisos comovidos. Um filme cujos diálogos soam mais a frases-feitas que a conversas humanas. Um filme que desconhece o que é a subtileza e que a substitui por uma realização gritante. Verá enfim um filme extremamente americano, não menos por seguir uma família texana que sobrevive à custa de concursos de beleza e músicas da Dolly Parton.  
 
Todos esses juízos e reprovações serão legítimos – e, no entanto, fáceis. Principalmente quando a realizadora Anne Fletcher, conhecida por filmes populares como Step Up (2006) e The Proposal (2009), não corre nenhum risco com a esta nova produção. Dumplin’ é, em termos cinematográficos, paradigma da mediocridade. 
 
Porém, este espetador que aqui se assume crítico dir-lhe-á que todos os passos em falso dados por este filme não são capazes de desvalorizar as virtudes e os princípios que fazem dele uma obra útil, necessária e bem-vinda. No clima incerto em que hoje vivemos, pautado por regimes políticos em que a regra é a exclusão social, o ódio e o medo, esta obra maximiza os sentimentos opostos: inclusão, fraternidade, empatia. 
 
A forma como o faz pode ser, admitamo-lo, por vezes simplista e sentimental; mas não é, como à primeira vista pode aparentar, totalmente previsível ou básica. Na verdade, o percurso da personagem titular – Dumplin’ é a alcunha que a mãe de Will, uma rapariga de figura rechonchuda, lhe dá – tem pormenores genuínos e subversivos. A narrativa amorosa entre Will e um rapaz que trabalha com ela num restaurante local é disso exemplo. Sim, o filme termina com os dois radiantes nos braços um do outro; mas Will não está radiante por ser amada por um homem, está radiante porque acabou de provar a uma cidade inteira e, acima de tudo, à sua mãe (uma Jennifer Aniston insípida), que a beleza não tem regras nem tamanhos. (Que Amy Schumer aprenda aqui.)
 
 
É em grande medida essa a convicção que Fletcher tenta martelar nas mentalidades da audiência. O seu filme é abertamente feminista, pró-LGBT+, antirracista e, como afirma uma das amigas de Will, que é gótica, lésbica e tem um sentido de humor cáustico, «contra a heteropatriarquia». Como filme feel-good que é, Will e as amigas conseguem relembrar esses valores à comunidade em que vivem, restaurando o direito à dignidade, aprovação e autodeterminação que todos merecem. Se isso passa por vermos personagens conservadoras, de mente fechada, abraçarem e dançarem com drag-queens, então que seja – é uma estratégia rudimentar, mas eficaz.
 
A coluna ético-moral de Dumplin’ esmorece qualquer crítica intelectual formalista. 
 
Guilherme F. Alcobia

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