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«Ghost Stories» (Noites de Terror) por Guilherme F. Alcobia

Pelo menos desde o clássico Dead of Night (1945) que as antologias de terror têm tido lugar cativo no cinema internacional: Kaidan (1964) é talvez o exemplo máximo do género no cinema japonês; na Europa, a colaboração franco-italiana entre Federico Fellini, Louis Malle e Roger Vadim em Histoires Extraordinaires (1968) é de realçar.

Contudo, sempre foi em particular na indústria britânica que estas colagens de pequenas histórias paranormais tiveram maior êxito, nomeadamente nos filmes da produtora Amicus, como Tales from the Crypt (1972). É neste recanto do universo cinematográfico que os principiantes Andy Nyman e Jeremy Dyson se estreiam com Ghost Stories. Infelizmente, a homenagem que prestam não é tanto um revigorar do género, mas uma mera reutilização de clichês já esgotados na vaga de filmes de terror que tem inundado as salas de cinema.

O filme segue Phillip Goodman, um professor e escritor de meia-idade que faz carreira de desmascarar alegadas aparições sobrenaturais. Interpretado pelo corealizador e coguionista Andy Nyman, Goodman é levado a investigar três casos particularmente alarmantes. Um guarda-noturno de um antigo manicómio (que original!), um jovem numa família disfuncional e um viúvo abastado são visitados por criaturas demoníacas feitas à medida de cada um. Se a bagagem psicológica da vida destes homens parece ser suficiente para justificar as suas visões, é porque… assim o é. Como o próprio protagonista reconhece, não há nada nestes casos que não possa ser explicado por uma criança de cinco anos. O verdadeiro mistério é então porque é que os realizadores acreditaram que uma audiência de adultos os acharia intrigantes.

Talvez porque esteticamente tivessem alguma forma ousada de revitalizar estas histórias através de estratégias audiovisuais provocantes. Não é o caso. Os jump scares são construídos da forma mais convencional; os motivos visuais não passam dos habituais manequins e luzes intermitentes; os cenários são edifícios desertos e florestas encobertas de nevoeiro; até os elementos sobrenaturais são a esperada criança possuída e a besta com cornos. A originalidade não é claramente o forte de Ghost Stories.

Se em termos estéticos e em termos temáticos este filme não acrescenta nada de novo à antologia de terror, será possivelmente por ser uma homenagem aos clássicos especialmente nostálgica que se torna mais tolerável. Os realizadores nomeiam Dead of Night (1945) como a sua maior inspiração e, ao falarem desse filme, concordam que «a ligação entre as histórias não é apenas um artifício, ela tem um papel importante» [1]. Também neste Ghost Stories o fio condutor das três narrativas é o elemento mais bem conseguido, atribuindo uma carga psicológica mais autêntica à motivação das personagens (embora explicada até à exaustão). Outros detalhes do enredo, como o uso de cassetes ou o documentário-dentro-do-filme (mockumentary), jogam com alusões e referências emblemáticas. 

O que, além disso, redime o filme é o facto de não se levar totalmente a sério, tendo pequenos apontamentos cómicos que amplificam o desassossego central. Para tal, o contributo de Martin Freeman, numa prestação irónica e enervante, é notável, se bem que nunca iguala a formidável atuação do jovem Alex Lawther (conhecido pela série The End of the F***ing World). Num filme dominado por homens, era de esperar que se tecesse algum tipo de comentário às ansiedades que hoje marcam a masculinidade, mas essa é outra oportunidade perdida neste filme.

Como está, é entre o humor e o tributo aos seus “antepassados” que Ghost Stories escapa à monotonia a que, de resto, está condenado.

Guilherme F. Alcobia