Quinta-feira, 25 Abril

«IO» por Jorge Pereira

Desenganem-se aqueles que pensam que este novo filme da Netflix, IO (uma das quatro grandes luas de Júpiter), traz algo de verdadeiramente original, misterioso, ou até minimamente interessante (e muito menos espetacular) para mostrar.

Na verdade, esta curta-metragem enfiada na “roupa” de longa parece apenas uma tentativa existencialista low cost de um qualquer filme apocalíptico ligado à destruição da natureza por parte do Homem (como os de Roland Emmerich). Por aqui prefere-se os tiques – maneirismos – do cinema indie, a narrativa assenta em monólogos, diálogos e pensamentos, algo que até funcionou moderadamente este ano com Agora Estamos Sozinhos, protagonizado por Peter Dinklage e Elle Fanning.

Em IO seguimos Sam Walden (Margaret Qualley), a filha do cientista especialista em alterações climáticas Henry Walden (Danny Huston). Sozinha num local da Terra, esta jovem – cujo último nome é uma clara referência à autobiografia de Henry David Thoreau ( que inspirado pelo confucionismo, retirou-se em 1845 para a floresta, onde passou a viver com o mínimo necessário e em intenso contato com a natureza) – continua o trabalho do seu pai, ausente aparentemente de forma temporária. O que sabemos pela introdução da história é que o Homem “envenenou” o planeta Terra e alguns dos sobreviventes conseguiram migrar para IO.

O dia a dia de Sam é normalmente passado a fazer experiências e a namoriscar – através de emails intergalácticos – com Elon, que se encontra já em IO. Tudo muda quando do céu não cai uma estrela, mas sim um balão de hélio improvisado onde está Micah (Anthony Mackie), outro sobrevivente que procura Henry.

A partir daqui, o jogo a dois protagonistas nunca arranca em nenhuma das suas vertentes potenciais. A tentativa de romance (ou química entre os dois protagonistas) é frouxa, o mistério é praticamente inexistente, e as conversas entre a ciência, a carnalidade e o existencialismo do Planeta e da espécie humana são demasiado desinteressantes e derivativas, mesmo quando pequenos apontamentos artísticos, com textos de T. S. Eliot, pensamentos da Grécia Antiga (Platão), e partituras de Chopin ecoam.

Na verdade, há uma tentativa frustrante de dar ao filme uma dimensão forçosamente poética, extremamente contemplativa e até filosófica, mas para se refazer um Adão e Eva longe do paraíso é preciso “ter pernas para andar”, e o argumento escrito por Clay Jeter, Charles Spano e Will Basanta revela nunca as ter.

Salva-se o trabalho visual deste série B soporífero, realçando-se a fotografia de André Chemetoff, conhecido pelas suas múltiplas colaborações com Christophe Honoré (Metamorfoses; Os Desastres de Sofia) e Romain Coppola (O Dia Chegará; Le Monde et a toi).


Jorge Pereira

 

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