Sábado, 20 Abril

«Bohemian Rhapsody» por Ilana Oliveira

O trabalho assinado por Brian Singer tinha diante de si diversas possibilidades de caminho, entretanto, a escolha acabou por ser a de um enredo genérico, pelo family friendly e pela criação de um herói em vez de ser-humano. Bohemian Rhapsody possui os mesmos problemas encontrados em filmes que geralmente decaem na glorificação de seu personagem principal, enquanto poderiam fazer um retrato franco desses mesmos. Neste caso, esta falha se torna ainda mais grave por contar a história pelos olhos de Freddie Mercury, vocalista de uma das bandas mais icônicas da história, a Queen.

Construir trajetórias em um espaço de tempo pré-definido, neste caso, os 15 anos de ascensão da banda até a apresentação no Estádio Wembley durante o projeto LIVE AID, pode ser significativo para ter mais profundidade nas personagens que são retratadas, porém temos um Mercury que – mesmo com suas falhas pessoais – não passa de um mocinho sob a influência de um agente de má índole responsável pela sua decadência.

Rami Malek, premiado pelo seu trabalho na série Mr. Robot, mesmo assim trabalha muito bem sua personificação, e traz ao ecrã a fluidez digna do performer, com trejeitos de fala, caminhar e postura, sem ceder ao caricato. O trabalho de Malik também é digno de reconhecimento nos momentos de playback das músicas, que só não é impercetível por conta da voz inconfundível de Mercury. Ao lado de Malik, temos Gwilym Lee, que faz um Brian May extremamente verossímil, sendo o mais parecido do elenco com o seu respetivo personagem real.

Ben Hardy conota uma energia juvenil e interessante a Roger Taylor e Joseph Mazzello é o mais esquecível como John Deacon. Por fim, Mary Austin, a única mulher relevante no roteiro (apesar de termos a mãe e irmã de Mercury em aparições simplesmente convenientes), é interpretada por Lucy Boynton, que faz um belo trabalho entre as dualidades de amar e ser amada, juntamente com as dificuldades de sua relação com Mercury, referenciado como gay pela obra.

Singer, mesmo assinando a realização de Bohemian, foi afastado do projeto, que contou com a finalização de Dexter Fletcher (que de momento prepara a cinebiografia de Elton John). O reflexo disso também aparenta para o espectador, já que os estilos de realização não encontram coesão, e são “agraciados” com uma direção de arte indecisa e pontual. Ainda, a montagem faz questão de alternar momentos de tensão com criação de músicas, o que nos afasta ainda mais da humanização daqueles que assistimos, e empobrece a narrativa com uma abordagem family friendly.

O problema final fica a cargo do argumento genérico, que prefere citar o uso de drogas em vez de mostrá-lo, porém os fãs de Queen se emocionarão com o último terço do filme, que demonstra uma qualidade técnica talvez perdida ao longo do filme por falhas de equipa criativa e problemas internos.

Ilana Oliveira

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