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«Searching» (Pesquisa Obsessiva) por Jorge Pereira

Unfriended é um exemplo acabado dos raros (mas vitais!) momentos em que um produto padronizado de estúdio demonstra ter um arrojo estético, porventura difícil de encontrar no circuito de cinema de autor.” Assim dizia o meu colega José Raposo na sua crítica a Unfriended [1], filme que através de um dispositivo cinematográfico – onde assistimos a toda a ação e eventos através de um laptop – dá uma nova dinâmica a uma “estrutura narrativa tradicional.”

Neste Searching, a história repete-se. Pegando no mesmo dispositivo (tudo que vemos é através de um laptop), Aneesh Chaganty conta a história de um pai que após o desaparecimento da filha começa a procurá-la como pode. É através da tecnologia que ele dá os primeiros passos, procurando incessantemente nas redes sociais e no seu computador indícios daquilo que lhe pode ter acontecido, conhecendo lentamente que na verdade, tudo o que ele pensava saber sobre ela era muito pouco.

Se o dispositivo não é novo, há engenho da parte do realizador na forma como emaranha este thriller, que não se contenta apenas com o lado misterioso e policial da investigação, mas entra também em mais ou menos complexas análises da relação de pais e filhos, sobre a solidão infantil após a morte de um dos progenitores, e a interação de todos com a tecnologia virtual e como ela se implantou na nossa vida. É que se nos sentimos uma formiga no planeta, se somos uma pessoa no meio de cinco mil milhões de habitantes, na Internet somos apenas um entre muitos mais milhões de entidades, pois para além de pessoas “mascaradas” na sua segunda e terceira “vida”, temos de lidar com boots geridas a algoritmos que se adaptam nos gostos das pessoas reais para criar entidades “com vida própria”. E se Yutaka Tsuchiya no seu explosivo GFP Bunny mostrava preocupação com a autovigilância (e a Bioarte, mas isso não é para aqui chamado) e deixava claro que a linha que separa as personalidades virtuais, o mundo dos avatares e o ser humano é cada vez mais ténue, e o (pseudo) documentário Low Definition Control: Malfunctions se focava com o grande pesadelo orwelliano da vigilância e do controle, Searching aplica muitos desses conceitos no seu laptop virado para nós, no qual deixamos muito de nós e qualquer um (neste caso o pai) pode pesquisar. É que já não se pesquisa apenas informações, encontram-se sentimentos, estados de alma a descoberto, e segredos que não partilhamos com ninguém no contacto directo.

Por outro lado, mesmo assistindo a tudo através de um computador, nunca perdemos a relação, empatia e sofrimento com o drama das personagens. Aí ajuda a performance dos intervenientes, com John Cho a dar nas vistas como o pai viúvo e extremoso apanhado numa rede de descobertas em relação à sua filha. Na verdade, Searching acaba por conquistar e ter mérito não pela inovação conceitual, mas pela forma como com ingredientes narrativos e cinematográficos já utilizados e temas existenciais quotidianos, ainda consegue entregar – qual DJ ou CineDJ, qual quê – um interessante “set” fílmico com algo mais para dizer que apenas e só ser mais um policial trivial.


Jorge Pereira