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«Elizabeth Harvest» por Jorge Pereira

Estávamos no final do século XVII quando Charles Perrault escreveu um conto infantil (La Barbe-Bleue) onde a personagem principal era um nobre com uma horrível barba azul que já tinha casado seis vezes, mas ninguém sabia o que tinha acontecido com as esposas, que desapareceram.

Elizabeth Harvest, o novo trabalho de Sebastian Gutierrez (O Beijo de Judas; Hotel Noir), é uma variação de ficção científica extremamente estilizada dessa mesma história, com o cineasta a ir buscar influências tanto a Hitchcock como ao Giallo, com os vermelhos, azuis e verdes a serem carregados na cinematografia e o design – entre o minimalista e o futurista – a criarem um sentido de desconforto, claustrofobia e isolamento, quer dos espaços, quer das personagens, entregues a fantasias, obsessões e malfadados fados.

Tudo isto seria extremamente proveitoso e valoroso se Gutierrez soubesse conter o seu pulso fetichista visual, que absorve todo um filme que narrativamente e na construção das personagens nunca consegue criar um verdadeiro elo com o espectador. Sim, o cineasta parece fascinado com a sua protagonista, Abbey Lee, expressando essa “paixão” em constantes exposições corporais da mesma, tão belas de se ver como qualquer videoarte exploratória. Isso nota-se em segmentos e sequências constantes da atriz desnudada, ou então a beijar um espelho para revelar o seu sentido de estranheza e duplicidade naquele ambiente de requinte, mas emocionalmente estéril. É que ao contrário de Nicolas Winding Refn – pense-se em The Neon Demon – o seu fascínio pela protagonista e pelas suas formas não têm equivalência no que quer mostrar, soando todo o filme a uma enorme curta-metragem numa longa, ou então a um conto de ficção científica que quer ser – ao seu jeito – um Ex-Machina na mistica do Barba Azul.

Ora, num enredo que envolve clonagem, criadores e criados, e personagens secundárias que estão ligadas a tudo com as suas próprias agendas, havia espaço para muito mais que tudo o que este Elizabeth Harvest oferece bem espremido. Fica a intenção e a beleza insípida das imagens…


Jorge Pereira