Sexta-feira, 19 Abril

«Upgrade» por Jorge Pereira

Depois da sua estreia na realização com Insidious: Capítulo 3, o australiano Leigh Whannell – um dos argumentistas e criadores de da franquia Saw – volta a dirigir um projeto na forma deste Upgrade, filme de orçamento baixo e claras limitações na forma como apresenta uma sociedade futurista onde a inteligência artificial volta a ser questionada.

Ao contar a história de um homem quadriplégico – Grey (Logan Marshall-Green) – que parte numa busca pela vingança da morte da mulher e da sua condição de “vegetal”-, Whannell apresenta ação e ficção científica à moda antiga em função das emoções primárias (a vingança), sempre coreografada de forma dinâmica e sangrenta (bastante gore) através de um protagonista com suficiente mística para se assemelhar a um Tom Hardy em correrias frenéticas e pancadaria à Jason Statham sob doses de um Peter Weller preso entre as decisões humanas e a das máquinas. Sim, referir o ator de Robocop e essa mítica obra de Paul Verhoeven é essencial na complexa distinção entre as ações regidas pela memória humana e da programação de uma máquina que o comanda, não fosse este uma produção sobre como esse homem paralisado ganha novo alento quando lhe é implantado um chip.

Mas Verhoeven não é a única influência, sendo óbvias as pinceladas de horror corporal de Cronenberg ou até de Kubrick, não fosse o STEM (o chip) uma espécie de Hal 2000 de 2001 Odisseia no Espaço. Todos estes elementos são apresentados em boas doses de ação série B, muitas vezes de tons grindhouse com cortes rápidos na montagem nas várias e estilizadas cenas de luta e com uma palete de cores incutida pelo diretor de fotografia Stefan Duscio que se mostra repleta de esquema de cores espampanantes de alto contraste, com os rosas, laranjas, sépias, os azuis, castanhos, cinzas e os vermelhos a funcionarem como um conjunto de dualidades e paradoxos, a acentuarem no mistério de cada uma das cenas e a ajudarem a um ritmo descontraído e pouco pretensioso.

E o melhor disto tudo é que ao ser verdadeiramente derivativo no tema e nos elementos colocados em cena (no argumento, na técnica cinematográfica), Whannell não se convence que isso basta, ou como o STEM diria, “nunca se torna suficientemente confiante” que tema e ação chegam para nos conquistar. Ao incutir as suas próprias ideias e ao lançar questões – algumas intelectualmente estimulantes quanto à evolução – o cineasta consegue fazer um dos mais conseguidos filmes do género dos últimos tempos, sendo quase certo que criou aqui um objeto de culto que dificilmente ficará por aqui.


Jorge Pereira

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