Terça-feira, 19 Março

«Leviano» por André Gonçalves

Obviously, Doctor, you’ve never been a 13-year old girl” (Virgens Suicidas

Alguma vez foste uma rapariga de 19 anos?” (Leviano)

Na sua primeira longa-metragem, após uma passagem pelo formato videoclip (formato que explica o “à vontade” do artista no corte e colagem dos muitos momentos musicais do filme), Justin Amorim entrega-nos um portfolio interessante de imagens, de planos, e algumas reminiscências de alguns dos autores mais interessantes do cinema contemporâneo, revelados no virar do século: sobretudo Sofia Coppola (começando pela citação acima de Virgens Suicidas, e pelo formato da narrativa remeter imediatamente a The Bling Ring) e o Harmony Korine de Spring Breakers (o filme assume até a certo ponto a lógica de filme de viagem “enfabulado”).

Quando Leviano falha, é precisamente por falta de edição. Amorim parece de facto tão decidido a querer mostrar tudo o que sabe fazer e bem – e não é pouco, dado que, para além de argumentista e realizador, participa também na montagem do filme – e todos os cineastas cool que claramente idolatra e quis referenciar, que sentimos que lhe falta ainda concisão de ideias e… identidade própria. 

Um crime é cometido. Uma jornalista com tiques sensacionalistas prepara-se assim para entrevistar a família Paixão, na base desta tragédia. Mas quem morreu e quem matou? Bem, obviamente essa pergunta tem resposta reservada para a última bobine. É caso para dizer, pelo menos, que quem esperava novela/televisão, sai defraudado. Se a resolução peca por enveredar por um rumo demasiado rebuscado, e que levanta mais perguntas lógicas, não se pode dizer que o jovem cineasta ceda a facilidades, mesmo nesta hora da verdade.

O elenco, tão bem vendido no cartaz e trailer, está aliás em boa forma diga-se de passagem – de todas maneiras que quiserem entender. Mas o meu destaque pessoal para ladrão de cenas acaba por ir para uma cara fora do cartaz oficial: a performance a roçar o camp de João Pedro Correia (Mau Mau Maria) a seguir o seu registo idiossincrático, a pedir spin off, ou melhor, que João César Monteiro regresse do mundo dos mortos para juntar esta “bicha antiga estóica” à de João de Deus num filme de super-heróis à séria.  

Entrámos assim à espera de uma mera jogada de marketing, realizado por uma marioneta de produtores como Tino Navarro et al, prontos então para disparar os tiros devidos, e saímos com o reconhecimento de que temos aqui um aluno extremamente aplicado, multifacetado e com um talento já aqui evidente. Caso consiga limar arestas do seu storytelling, segurar melhor as personagens, e expandir ainda mais o seu óbvio talento latente numa voz indistinguível libertando-se de vez da lógica videoclip/VJ e das referências mais que óbvias, Portugal vai ouvir mais o seu nome, quer queiram quer não. Para já, este portfolio merece uma espreitadela livre de preconceitos, e um maior tempo de permanência em cartaz do que irá inevitavelmente ter… 

 

André Gonçalves

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