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«Lean on Pete» (O Meu Amigo Pete) por André Gonçalves

Quantos cineastas se podem gabar de ter dois primeiros filmes como Weekend [1]e 45 Anos? Não muitos, certamente. Daí que a expetativa para um novo filme de Andrew Haigh estivesse inevitavelmente alta.

Tendo já rompido com a bolha queer (não sem antes ter dado a já icónica série de televisão Looking) e demonstrado uma vontade de expandir horizontes com o anterior filme onde Charlotte Rampling questionava se os seus últimos 45 anos em conjunto não foram uma mentira aprendida, Haigh volta a mudar de contexto, indo agora para um adolescente de uma cidade rural que acaba por fazer amizade com um cavalo, como compensação para a disfuncionalidade da sua família.

Em Lean on Pete, o autor britânico oferece-nos duas narrativas bem clássicas do cinema norte-americano: o coming of age e o road movie, filtradas por uma cinematografia inescapavelmente bela e uma aura confiante de realismo social legitimada (Bresson em primeiro plano, irmãos Dardenne mais recentemente). Mas este enamoramento bem evidenciado pelo passado ameaça também seguir os piores vícios de quem está decidido a deixar a “lamechice” de parte – nomeadamente confundir subtileza (e pensar que se é mais subtil do que realmente é, é também considerado pecado capital para este escritor) com distanciamento emocional. Isto torna-se mais gritante quando os elementos não tão subtis estão claramente aqui a separar literalmente atos.

Por outro lado, o cinema já demonstrou que filmar relações entre cavalos e humanos não é tão fácil como filmar pessoas – nomeadamente no que toca a criar laços emocionais com o espectador, sem cair ou na lamechice ou num estado de anestesia. Assim de repente, no cinema recente, diria que só Robert Redford o soube fazer bem (O Encantador de Cavalos). Quanto menos falarmos do Cavalo de Guerra de Spielberg, melhor. Não deixa de ser irónico, que, perante uma personagem órfã da vida como esta – um festim típico para Spielberg, Haigh ofereça-nos algo nos antípodas, mas igualmente em falta para com o espectador que se esteja a marimbar para a técnica e queira emoção pura. Lean on Pete revela-se assim um filme anestesiado, tão enamorado pelas suas referências que se esquece que a rédea curta que mantém ao longo de duas horas não é suficiente para o payoff emocional que tenta possuir. E para complicar, com a jovem revelação Charlie Plummer (excluindo Travis Fimmel, em quinto plano) a revelar-se o único elemento do corpo de atores de classe A capaz de atribuir verosimilhança à história – felizmente este está em praticamente todos os planos do filme. Assim fica difícil nutrir mais que uma mera nota de respeito.

André Gonçalves