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«Wilde Maus» (Wild Mouse) por Jorge Pereira

Curiosa a opção do ator austríaco Josef Hader em se estrear na realização com a história de um crítico musical snob que, depois de perder o seu emprego, embrulha-se numa série de mentiras e prepara a vingança contra o seu antigo chefe, isto enquanto passa os dias num parque de diversão com um casal bem longe dos seus padrões culturais.

E digo curioso porque Hader tinha aqui uma bela oportunidade para, de forma sarcástica e intrusiva, falar de problemas atuais do mercado de trabalho, da crise do jornalismo (e o desaparecimento ou emagrecimento das secções culturais) e de uma classe média aburguesada que vê o chão sair debaixo dos pés e que fica sem saber muito bem o que fazer – entre a letargia e a depressão, numa verdadeira monta-russa de emoções (como a que vemos em cena e que dá nome ao filme).

Infelizmente, Hader falha em quase tudo, não só porque cai no ridículo, na descida vertiginosa de alguém que vê claramente a sua masculinidade afectada, não só pela perda de estatuto, mas também porque não consegue engravidar a mulher, uma psicoterapeuta que deveria interpretar melhor o que tem em casa e criar melhores condições para o diálogo.

Mas o pior, para além dessa descida vertiginosa ao inferno pessoal, calcada especialmente num último terço nada empático e desarticulado, é a falta de acutilância crítica para sair do mero filme auto-indulgente e umbrático.

E mesmo que Hader ainda coloque peças do dia a dia do Mundo espalhados pelo seu trabalho (notícias da guerra na Síria, o Daesh, etc), como se o objetivo fosse contrapor os “problemas insignificantes de 1º mundo” que o nosso crítico tem, então falta uma clara incisão picaresca, uma verdadeira machadada que vá além dos truques de ilusão imagética e sonoros que o filme oferece, com La Follia de Vivaldi a implantar-se nos nossos sentidos à força.

No todo, Wilde Maus peca pelas personagens pouco profundas e tratadas de forma ligeira e superficial, pelos eventos que se sucedem em formato sketch e repletos de resoluções fáceis e apressadas, e pelo julgamento tíbio e distante que o próprio cineasta faz numa comédia que quer ser eclética e sombria, mas que na verdade, acaba por ser como a sua personagem principal: presunçosa, pouco imaginativa e cobardolas…


Jorge Pereira