Quinta-feira, 28 Março

«The Babysitter» por André Gonçalves

Tenho uma confissão a fazer: gosto de McG. Não para o pôr num patamar de grandes realizadores, mas porque precisamente não o levo tão a sério como alguns dos meus amigos mais “hipsters” do que eu. É o meu Michael Bay, de certo modo.

Há muita obra de arte para ser levada a sério, ou então meramente pretenciosa. Desde o seu primeiro filme, McG assumiu apenas um “statement“: divertir o espectador através de açúcar audiovisual. Trazer-nos entretenimento de escape com marca de água, bombons cinematográficos, embrulhados por uma estética videoclipe, por uma vontade de ver o cinema mais pelo poder sensorial, mesmo que deixe buracos lógicos no meio da sua destruição.

Quando a vida nos dá limões, faz-se limonada. Quando o cinema dá doces como foram por exemplo os dois Anjos de Charlie, aproveita-se a moca de açúcar ou ridiculariza-se a composição nutritiva. São opções igualmente válidas, mas pessoalmente gosto de açúcar, que se pode fazer?

O regresso esperado por poucos em 2017 trouxe o realizador para uma nova realidade: o streaming (via Netflix). Se à partida podemos pensar que é um retrocesso para um cineasta que tanto lutou para proporcionar momentos bombásticos no grande ecrã, existe um bónus: liberdade criativa. The Babysitter pode ser muita coisa que concorde: pubescente, ridículo, sobre-referencial. Mas uma coisa podemos concordar: nunca é aborrecido, e nunca se contém.

Nesta sua incursão pelo terror, a referenciar claramente uma série B encontrada noutros tempos em prateleiras poeirentas de videoclubes, o realizador despeja-nos galões de sangue com o entusiasmo de um adolescente a descobrir ainda como o seu corpo funciona (ou de Quentin Tarantino). E é precisamente nessa pubescência que o filme afinal se desenrola: na atração perigosa por uma “babysitter” por parte de um adolescente bem comportado, que, uma noite, decide perceber o que ela faz quando ele vai dormir…

Poderíamos qualificar The Babysitter como McG “vintage”, se houvesse de facto uma carreira longa para falarmos. Passando por um esforço de sobriedade como Terminator: Salvation (ainda o mais original dos filmes pós-Cameron, diga-se de passagem), o que o cinema vai lembrar deste autor que nunca foi é precisamente esta escola de corta e cola, com músicas “pop” como substituição de instrumental a romperem sem serem necessariamente convidadas, e mesmo quando não temos “pop” na música, um tom sempre autoconsciente da sua própria natureza pubescente, a piscar o olho ao espectador e à cultura pop que lhe precedeu (E.T., Independence Day, Battlestar Gallatica, Alien, Predator, etc. ).

Sim, cenas como a ação entre duas raparigas são facilmente geradoras de revirares de olhos em 2017, mas temos que dar o desconto e nos pôr no tempo de McG. Resumindo, o espectador que consiga mastigar o que há aqui de doce vai desejar que mais filmes de terror fossem nesta veia. Para mim, senti que viajei numa cápsula do tempo, e senti estes 85 minutos mais adoráveis que muito filme sóbrio visto no último ano…


André Gonçalves

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