Terça-feira, 19 Março

«Looping» por André Gonçalves

Há filmes de narrativa aberta, há filmes que dispõem de uma lógica de sonho/pesadelo e há filmes como “Looping”, difíceis de defender até num contexto queer.  

Separado em três histórias de três mulheres, de três gerações, que se encontram numa clínica psiquiátrica, para aí se renovarem em conjunto, numa relação que foge a rótulos convencionais, o filme demonstra inicialmente uma vontade até de seguir um caminho linear. 

Nos primeiros minutos de filme, tudo é moderadamente interessante e tudo faz algum sentido, portanto. A primeira história, claramente o “sumo” do filme, acompanha Leila, uma adolescente que ao sofrer um desgosto de amor, é violada por um camionista, e só a vemos depois, a acordar de um hospital, e a pedir transferência para um asilo psiquiátrico, onde a liberdade aparenta ser total, e o corpo de médicos e enfermeiros inexistente.  

A partir do momento em que Leila entra então neste esconderijo estranho – final do primeiro ato, se isto fosse uma narrativa linear, lá está – o filme deixa totalmente de fazer sentido, e convida muita da sua audiência a sair. A realizadora Leonie Krippendorff depressa afia as suas garras queer e transforma o que poderia ainda ser um filme relativamente abstrato sobre a doença mental numa mera disposição de imagens fotograficamente estimulantes (refletindo a sua paixão pela fotografia) acompanhadas por uma ou outra nota musical interessante, sem qualquer guia para o espectador, a não ser convidar os mais resistentes a perderem-se na falta de lógica que encerra o seu mundo. 

Lógica de sonho? Não me parece. “Looping” apresenta o sonho/pesadelo aqui e ali, numa das suas protagonistas, para depois se revelar com maior lógica do que se passa fora do sonho. Não pretende ser um tratado sobre doença psiquiátrica também. Krippendorff odeia convenções narrativas. Tudo bem. Mas nada o impede de ser um objeto que vai ficando crescentemente aborrecido nos seus demasiado longos 106 minutos, como um soporífero – ao ponto de querermos no final, arranjar uma bebida energética para garantir que aguentamos o resto do dia.

André Gonçalves

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