Um homem condenado à imortalidade num Japão feudal, um país honrado, mas igualmente governado pela lei do sabre. Takashi Miike pega na manga de Hiroaki Samura, Blade of the Immortal, e estabelece uma trégua entre o seu devaneio e o público ávido das produções em massa e sobretudo do género samurai que, de vez em quando, aparece entre nós. O polivalente realizador nipónico respeita a violência gráfica da matéria-prima e a direciona ao seu proveito.

Encontramos assim o filme despreocupado que prenunciávamos; o Miike delinquente, agressor e, sobretudo, virtuoso na sua compostura. Blade of the Immortal é a autêntica resposta para o modelo de entretenimento que tem abarrotado os nossos cinemas, esse domínio Disney, moral e politicamente correto, aqui desafiado num duelo de catanas. A ética é distorcida, os diálogos apontam para uma descompensação da linguagem mercantil e o nosso realizador confirma a liberdade que sempre possuíra nos seus projetos. E faz isso, adivinhem só, com o seu filme mais contido e sóbrio. Selvaticamente sóbrio!

É a hipérbole da violência, doses quase industriais que nunca cedem ao repouso. Não existe tempo a perder com relações afetuosas de última hora, nem interiorizações existênciais, porque Blade of the Immortal remexe em tal veia num jeito naturalmente gazeteiro, e voluntariamente rebuscado, ainda assim bem sucedido. Mesmo que a narrativa priorize o “banho de sangue” e abandone o desenvolvimento das suas personagens em prol de uma atitude exploitation, Takashi Miike respeita, primeiro, o seu espírito, mundialmente conhecido, e, segundo, a essência do formato manga. Tudo isto produzindo um filme série B levado da breca, uma declaração de que o cinema não é de todo limpo e servido a causas samaritanas.

A violência pode ser criativa e ao mesmo tempo descontraída em relações a catarses e éticas impostas. Para quê reclamar com o explicito, em que várias vezes a violência é sugerida de maneira mais bruta nos enésimos filmes de super-heróis?