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Get Out: foge quando ainda é tempo!

Questões raciais num EUA ideologicamente repreensivo que parece ter encontrado lugar nos discursos de Trump. É cliché afirmar isso, mas é sob esse carvão que Get Out se tornou num entusiasmante exercício de série B, um misto entre a correria pela sobrevivência de enésimos filmes de terror e das conspirações à la The Stepford Wives (Mulheres Perfeitas).

Dirigido por Jordan Peele, Get Out repesca o medo da discriminação e da supremacia branca, porém, a reviravolta suscita outras encruzilhadas que parecem fazer frente ao nosso dia a dia. Existe um ponto de identidade e como essa identidade é definida sobre as convenções da sociedade atual; o porquê de regermos os estereótipos étnicos e raciais; e a persistência na ignorância que nos levam a um beco sem saída. Será o racismo parte integrante da nossa condição enquanto ser humano de consciências morais, ou simplesmente um apelo primitivo ao que desconhecemos individualmente?

Para Chris (Daniel Kaluuya) seria simplesmente um fim-de-semana normal na casa dos pais da sua namorada (branca). Contudo, alarmado, o nosso protagonista questiona se ela advertiu ou não os progenitores quanto à cor da sua pele. “O meu pai teria votado em Obama pela terceira vez se pudesse. Ele não é racista“. Foi esta resposta que deixou seguro Chris. Só que tudo não passou de um engodo. A chegada a este “paraíso maioritariamente branco“, uma comunidade onde os negros parecem comportar-se de maneira bizarra, é atribulada e rodeada de suspeição e Chris sente-se uma presa de algo que não consegue explicar.

É fácil cair no erro de considerar Get Out em mais um arquétipo do “bate e foge” como tem sido claro no cinema deste género. Felizmente, os marcos do género aqui incutidos são um embuste, um disfarce para que Peele consiga difundir a sua mensagem através da sua “voz”. Voz essa perturbada com o crescente temor sociopolítico que abraça os EUA pela discussão na “praça pública” de temas que se consideravam “enterrados” há anos. Sim, Get Out é um filme sobre o medo. E é também nesse medo que encontramos o ponto de ebulição e o lançamento de farpas às mob flash politicamente corretas que –  à sua maneira – são culpadas pela crescente vaga de populismo e de idealismos do arco-da-velha.

Inquietante, suspenso pela sua metáfora que dissipa na atmosférica “wannabe” do clássico enredo do terror corriqueiro, o filme, sob a produção de Jason Blum (o produtor que tem vindo a renovar o cinema de terror com sensações low cost como The Conjuring, Sinister e Paranormal Activity), revela-se um dos seus trabalhos mais metódicos e socialmente relevantes.  

Depois disto, há que referir o óbvio, Daniel Kaluuya dá uma força à fita e LilRel Howery é um comic relief tipificado a servir de gelo para um ambiente a ferver. Com isto, Get Out é livremente perturbador.