Depois do sucesso contido de A Visita, era com tamanha expetativa que se aguardava este retorno de M. Night Shyamalan à sua zona de conforto – o thriller convencional – sem com isto insinuar que o género adquire banalidade nas suas mãos. 
 
Fragmentado é o típico filme que o realizador poderia ter feitos anos atrás, na altura em que banhava dos “raios de sol” transmitidos pelo frenesim de O Sexto Sentido e do ameno sucesso de O Protegido. É um projeto limpo, longe das “invenções” que condenariam o autor aos olhos do público e da crítica mais generalizada. Porém, foram essas transcendências, pelo qual vislumbramos a melhor das facetas de Shyamalan, o conhecimento dos códigos do thriller de estúdio e a vontade de desmontá-los para depois reconstruí-los de forma desafiante. Nesse ponto, salientamos a parábola de A Vila (hoje visto como a sua “obra-prima“) e o “condenávelA Senhora da Água, a análise corporal da fábula que resultou num dos seus filmes mais criticados (mas dos mais resistentes em questões de revisionismos temporais). 
 
Mas em Fragmentado, o que evidenciamos é uma jogada segura, onde a ousadia é apenas uma “provocação” míope. A intriga de um psicopata de 23 personalidades, tendo como base uma história verídica de Billy Milligan, daria facilmente numa obra complexa e formidavelmente agressiva. As primeiras notícias em relação a este projecto apontavam para Leonardo DiCaprio como um eventual protagonista, um ator de método Strasberg que facilmente direcionaria a obra para campos psicologicamente, como também, fisicamente improváveis. A alternativa encontrada foi James McAvoy, que nunca encontra o “norte” nesta multifacetada tendência ao improviso, ou a personificação automática, falhando redondamente na atribuída credibilidade na(s) sua(s) personagem(ns). 
 
É um rapto que nos transporta directamente para os confins do “exercício de cerco”, para depois incendiar-se como uma catarse de contornos sobrenaturais aos limites da mente humana, da mesma maneira que Scarlett Johansson foi vítima em Lucy, de Luc Besson. Mas Shyamalan faz desta sobrenaturalidade, um equinócio de dois teores, uma sugestão a ser abordada com o maior dos cepticismo por parte do espectador. Um banalizado jogo de gato e rato que serve como prosseguimento neste pesadelo “freudiano“. Uma “roda furada” apenas sustentada pela constante oposição de Anya Taylor-Joy (The Witch) e pelos toques “shyamalanos” (poderemos chamar assim) que nos faz respirar ocasionalmente de alívio (a evidenciar mais um “conto” de fé e superação individual). O autor encontra-se novamente confiante e como tal, esperemos que este medíocre episódio sirva de apelo para um novo universo que aí avizinha-se chegar. 
 
Enquanto A Visita, onde o found footage demonstrou a sua medula óssea, em Fragmentado, “saboreamos” o regresso de um realizador acima da industrialização, porém, cedido a esta para sua própria sobrevivência. Sim, Shyamalan, temos que falar … seriamente … porque o teu futuro não se resume somente a sobreviver.
Pontuação Geral
Hugo Gomes
André Gonçalves
split-fragmentado-por-hugo-gomesUm filme de personalidades, ao invés de filme com personalidade