Sábado, 20 Abril

«Assassin’s Creed» por Hugo Gomes

Videojogos e cinema são tão compatíveis como azeite e água, mas nos últimos tempos, em paralelismo com a evolução das adaptações de BD no grande ecrã, tais plataformas parecem ter, por fim, adquirido alguma linguagem cinematográfica … e sim … no cinema.

Longe vão os tempos das marginais e trapaceiras conversões dos anos 80 e 90, hoje vistas como uma “espécie de paródias” (Double Dragon, Street Fighter e Super Mario Bros.), do low cost de Uwe Boll e das barafundas “sequelites” de Resident Evil. Pouco a pouco este subgénero mentalizava as suas próprias convenções cinematográficas, obviamente tendo cumplicidade com a grande indústria. Tal “marco” aconteceu no ano passado com a chegada do muito procrastinado Warcraft (que fora arrasado pela crítica norte-americana), o qual somaria um mais um nas equações relativas a grandes produções de Hollywood. Duncan Jones, assumido fã da franquia, torna o imaginário anteriormente regido ao campo dos videojogos em matéria fértil para adaptações emancipadoras. Finalmente, existiu uma mitologia “emprestada” própria que viabiliza o produto para uma vasta abrangência de audiências, sem condensá-lo a habituais “gamers“. A seguir as pisadas de Warcraft surge-nos Assassin’s Creed, a estadia do popular franchise da Ubisoft no grande ecrã, exercido e trabalhado como uma produção de alto nível técnico e recursivo.

Michael Fassbender e Marion Cottilard são atores de lista A a protagonizarem este misto de épico e ficção cientifica de profunda influência na série B, se não fosse o macguffin ser verdadeiramente “patético“. No seu todo, este é o tipo de entretenimento induzido a massas com mais perdas que ganhos, até porque a história é esquecível. Quem sobretudo joga sairá defraudado e a complexidade dos enredos dos títulos de videojogo são condenados a minimalismos preguiçosos.  

Mas, e como sempre existe um mas, este Assassin’s Creed preserva alguns atributos invejáveis e valiosos em comparação com a indústria atual. Entre elas está a dedicação empenhada na reconstituição histórica (apesar dos visuais serem demasiados escuros em conformação com o território flashback), e, nesse contexto, a preservação de uma linguagem nativa. Visto que este subenredo leva-nos aos tempos da inquisição espanhola e de uma Península Ibérica ainda dividida por reinos disputados, o castelhano é ouvido, por entre um elenco sobretudo espanhol e até mesmo na estrela Michael Fassbender.

O ator, como é costume, resulta noutro arquétipo sofredor; o constante torturado como tem sido o habitual na sua carreira, e Cottilard, a instalar-se com algum carisma (e nada mais). Porém, a química de ambos é visível, e pudera, visto que contracenaram, sob as ordens do repetente Justin Kurzel, em Macbeth. O realizador deixa para trás Shakespeare para implantar Shakespeare numa produção que tinha tudo para “enfiar-se” na tragédia. Felizmente, não saiu-se tão grego nesse patamar, mas apesar dos valores de produção, Assassin’s Creed está longe da bravura pelo qual foi apontado num subgénero “maldito” e resistente perante tais contratempos. 

O melhor – alguns pontos positivos numa produção deste género

O pior – ser dispensável

Hugo Gomes

Notícias