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Tão Só o Fim do Mundo: os autores, as suas fraquezas, solipsismo e egos

A difícil arte de ser Xavier Dolan, as complicações geradas por ser aclamado em tenros anos e consecutivamente ao longo da sua, até então, imaculada carreira. Se por um lado, ouvimos constantemente citações de historiadores e outros especialistas cinematográficos de que um “autor, até a obra mais fraca é melhor que tantas de outros realizadores“, por outro, através de reflexões sobre o sentimento vivido por este Juste La Fin du Monde, um outro conselho surge ao meu alcance: “quando se gosta de um autor, somos os primeiros a admitir que ele errou“.

Porém, antes de começarem com as “pedradas“, questiono o seguinte, será correto considerar o ainda jovem franco-canadiano Xavier Dolan, num autor cinematográfico? Porque não!? Contudo, não é esta a derradeira questão aqui envolvida, aliás, muitos esperam que o nosso “cineastazito” prove de uma vez por todos que é digno desse título (sendo que em Mommy [1] já havia provado que as aclamações precoces não foram um erro). Mas em Juste la Fin du Monde, a recente obra que ganhou mediatismo com os “surpreendentes” apupos na sessão de imprensa de Cannes, existe um claro tom de “auto-estima elevada“. Talvez tenha sido esta sensação de “triunfo antes do sabor” que causou o maior choque entre o então adorado Xavier Dolan e os críticos que apelidavam o seu novo trabalho como “desastre artístico“.

Adaptação de uma peça teatral de Jean-Luc Lagarde, Juste La Fin du Monde beneficia de um ambiente caótico de procrastinação, enquanto a intriga começa a ganhar forma, desenvolvendo para lado nenhum, dando a sensação de impotência e clara frustração ao espectador. Esta é a história de um escritor homossexual que vai encontro da sua família para anunciar a sua breve morte, visto que é um seropositivo de HIV. A respetiva família, que desconhecia o seu paradeiro e o estilo de vida levado a cabo pelo seu ente querido, tenta o receber da melhor forma possível, mas os assuntos inacabados, que o nosso protagonista deixou para trás, o confrontam.

Sim, Xavier Dolan acerta na “mouche” quanto ao teor a ser invocado neste drama de complexidades familiares, mas o que não anteviu é que por vezes o cinema tem que desligar do palco teatral para assumir a sua vida emancipada. Resultado isso, evidentemente, é um esforço descomunal na caracterização dos seguintes personagens, inseridos num rótulo de morte anunciada, a outra é os desempenhos, prometedores mas “fogo de vista” face a uma claustrofobia descontrolada deste enredo de manutenção de relações afetivas.

Existem demasiadas pontas soltas aqui, obviamente que Dolan não irá resolver tendo em conta o respeito pela obra original, mas falta de extensão, do alinhamento, e da renegação com a artificialidade constrangedora com que tenta transformar drama de 2ª Arte para Sétima Arte, o leva para “becos sem saída” de criatividade intrínseca. Ao menos assumisse tudo como “teatro filmado” como Manoel de Oliveira sempre o fizera. Assim sendo, as personagens parecem “morrer” demasiado cedo, as atuações não se vingam perante tal voluntária barafunda (mesmo que Vincent Cassel, Gaspard Ulliel e Marion Cottilard mereçam destaque) e a técnica (fotografia, por exemplo) entra em conflito com o trabalho de escrita e de coordenação.

E assim chegamos a outra questão, será a obra merecida de a sua devida reavaliação, a revisão por novas audiências? Não nego, cheira-me a filme a ser valorizado daqui a uns valentes anos, mas também não é com esta “fruta podre” do cesto que nos vai fazer desligar do potencial de Dolan. Por isso, que venha esse The Death and Life of John F. Donovan, porque está provado que o fim do mundo não é matéria para o nosso realizador.