Quinta-feira, 28 Março

«Angry Birds» (Angry Birds: O Filme) por Hugo Gomes

Pássaros irados que se lançam em fisgas contra porcos acéfalos, uma imagem que tão bem serviria de figuração aos desejos íntimos de muitos críticos de cinema no final dos seus visionamentos, é na verdade a inesperada adaptação de um êxito dos videojogos de telemóveis produzido pela finlandesa Rovio Entertainment.

A intriga da aplicação é simples, um grupo de porcos invadem uma remota ilha habitada por pássaros inaptos de voo e roubam os seus ovos. Para reavê-los as ditas aves terão que “destruir” os suínos e as respectivas habitações através de lançamentos de fisga (uma completa ironia). Uma animação baseada numa premissa assim seria “sopa de galinha” para argumentistas, mas a verdade é que todo o conceito de Angry Birds tem de relacionado com o prolongamento da teoria “dodologia” da escritora Clara Pinto Correia, ou seja a extracção de um triste fenómeno (i)natural  que tem vitimado imensas espécies endémicas de aves, entre as quais, o mais famoso, o Pássaro Dodó.

Para quem desconhece o pássaro dodó é uma espécie que não se encontra nós, uma ave que encontrou numa ilha pacifica e remota [Maurícias] o seu perfeito lar e evolui de forma a ser um animal amistoso e inepto para o voo, factores que facilitaram a sua extinção com a chegada do Homem, que por sua vez trouxe consigo algumas espécies não naturais no “mundo” conhecido pelo dodó. Falo obviamente de ratazanas e de porcos, estes últimos conhecidos por comerem-lhe os ovos. Na maior das possibilidades o jogo Angry Birds teve inspiração nessas tristes histórias que ainda hoje envergonham a Ecologia, ao contrário das teorias suscitadas recentemente com a estreia do filme, de que é baseado em ideologias de anti-imigração que os partidos neo-nazis norte-americanos têm adoptado para promover as suas politicas Trump.

Quanto à animação, Angry Birds poderá ser encarado como um filme bem-humorado e devidamente “esgalhado” em alguns dos seus gags, mas transmite uma mensagem estranha, possivelmente até perigosa para os mais novos – a raiva é um sentimento que pode ser útil para lidar com certas e determinadas situações. Tirando isso, esta é uma produção sem pretensões para uma estatueta, aliás a sua postura é leve, nunca acentua uma ênfase dramática nem se apoia em moralidades, porém, é enriquecedor de certos traços satíricos de uma Dreamworks menos esforçada.

Existe uma ou outra personagem a merecer registo entre o público, mas Angry Birds “fisga-se“, literalmente, da sua própria condição de filme durante o seu terceiro e último acto, onde o merchandising toma conta e uma réplica dos parâmetros do videojogo é imperativo a amostra. A barafunda toma conta deste mesmo capítulo, perdendo-se em gags soltos e Deus Ex Machina ocultos.

Mas nada que verdadeiramente prejudique a proposta, até porque o resultado baseou-se num videojogo, e como tal, não se deve pedir mais do que exigido em termos de produto negociável às audiências estivais. Para todos os efeitos este será uma das melhores adaptações de um videojogo no Cinema (o que não é um título por aí além).     

O melhor – O humor inicial

O pior – Um terceiro ato dependente aos parâmetros do videojogo

Hugo Gomes

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