Quinta-feira, 28 Março

«Aragane» por João Miranda

Filmado numa mina algures na Bósnia, Aragane pretende mostrar o esforço físico do trabalho mineiro. A economia mundial baseada ainda em recursos não-renováveis transforma esta indústria numa das mais necessárias mas, como em quase tudo, a ideia que os trabalhadores são todos substituíveis e se deve investir o mínimo para retirar o máximo lucro possível faz com que a realidade destes seja miserável. Mal pagos e quase sem protecção (capacete e nada mais), estes homens trabalham em turnos de 8 horas de esforço e escuridão contínuos.

Mais uma reportagem fotográfica que um filme, Aragane, de Kaori Oda, acaba por fascinar-se mais com o jogo de luzes na mina do que com a humanidade literalmente debaixo dela (as luzes estão nos capacetes). E é com esse pequeno desvio que se perde qualquer boa vontade na intenção inicial da realizadora. Como outros filmes em competição no Doclisboa, Aragane, apesar do título (aragane quer dizer “minério” em japonês) e da declaração de intenções da realizadora, é apenas mais um daqueles filmes experimentalistas que se fica pela forma e aliena o público.

Qualquer pessoa que tenha feito uma visita guiada num museu (especialmente aquelas que se focam só numa obra) sabe como o que vêem se abre com as explicações e as histórias que são contadas. A opacidade do simbolismo e da imediatidade (a pintura é um meio denso) desenrolam-se com ajuda do verbal, permitindo atingir uma profundidade que não é acessível ao leigo. Um filme, como trabalha com o tempo e a palavra, para além da imagem, não deveria necessitar de uma visita guiada para se compreender mais do que uma meta-narrativa sobre a sua produção ou o contexto em que foi feito. No entanto, estes filmes, não só não são suficientes no que apresentam, como são intelectualmente desonestos para com os seus conteúdos e o público.

O Melhor: A imagem.
O Pior: A desonestidade intelectual.


João Miranda

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