Sexta-feira, 29 Março

«Freeheld» por Paulo Portugal

O tema é mais do que louvável e até a sua fixação num filme é bem-vinda. Contudo, a dramatização da história verídica do drama pessoal e social vivido pela tenente da polícia de New Jersey, Laurel Hester, impedida de deixar em vida a sua pensão à companheira de vida Stacie Andree, tal como sucedia com os seus colegas masculinos, em virtude do seu cancro fulminante, não acrescenta méritos cinematográficos. Pena é que a partir do louvável tema de defesa de direitos sociais das pessoas do mesmo sexo se faça passar todo o apelo do filme num muito frouxo exercício de cinema, cujo único fundamento é puxar o envelope da emoção fácil empolada por uma banda sonora cuja única função é sublinhar os momentos de emoção.

Apoiado por um cast com dois pesos pesados, Julianne Moore que já anos provou que é capaz de encarnar qualquer tipo de papel – ainda que ainda tenhamos na memória o algo semelhante O Meu Nome é Alice, que finalmente lhe daria o seu há muito merecido Óscar -, assume com Laurel Hester o perfil de uma detetive de maneirismos bem masculinos, mas que se deixa seduzir pela bem mais jovem Stacie, numa interpretação com química por parte de Ellen Page, ela própria que assumiu a sua homossexualidade recentemente. Há que referir ainda um competente Michael Shannon, como o muito macho e heterossexual agente que cumpria missões em conjunto e que acabará por defender a causa da colega. Por fim, o histriónico advogado judeu que usa a causa de Laurel como bandeira para a luta dos direitos do casamento gay, num Steve Carrell feito “clown” e a roçar os limites do suportável.

Apesar química credível entre Moore e Page, Sollett centra-se naturalmente na batalha que travou com os membros da câmara no sentido de ativarem a possibilidade de ultrapassar o conservadorismo habitual e decidirem em função de inovar a lei do Estado.

É pena que Peter Sollett, um realizador novaiorquino cuja carreira tem sido marcada por alguma irregularidade, não tenha conseguido fazer melhor que um filme panfletário sem alma, apenas à procura de emocionar o espetador. Ele que até começou a sua carreira dentro de um cinema independente, de bairro, na sua estreia, em O Verão de Victor Vargas, em 2002, apesar de ter cedido gradualmente a um estilo mais comercial, com Nick and Norah’s Infinite Playlist, apesar de contar com Michael Cera. Uma oportunidade gorada para fazer cinema.


Paulo Portugal

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