Sexta-feira, 19 Abril

«Barefoot» (Amo-te Como És) por José Raposo

Amo-te Como És, uma comédia romântica realizada pelo desconhecido e inofensivo Andrew Fleming, propõe-nos uma história de amor a condizer com o caráter dos seus personagens. A despreocupação um pouco pateta da narrativa, centrada no improvável encontro entre o par romântico (Evan Rachel Wood e Scott Speedman) em fases particularmente complicadas das suas vidas, é mais um exemplo acabado da banalidade discursiva que tem atravessado o género.

Após a morte da sua mãe, uma figura com fama de abusadora e também ela mentalmente incapaz, Daisy é internada num hospital psiquiátrico onde acaba por conhecer Jay, que ali se encontra a trabalhar como empregado de limpeza. Estas circunstâncias terão consequências à la carte: um conjunto de desafios e problemas que irão testar a fibra moral do par, acabando por colocá-los no caminho da felicidade. Partem rumo a New Orleans para assistirem ao casamento do irmão de Jay e é a partir daí que começa a aventura.

Sem grande inspiração narrativa, não é pois surpreendente que o humor seja também a condizer, sempre condescendente em relação a Daisy, a “maluquinha de serviço”, cujo desajuste para com as coisas do mundo é sempre motivo de gargalhada. Não tem realmente muita piada, apesar de todas as aparências, como também não terá nenhum charme o mal comportado Jay. Mais: esta dramatização da atração de personalidades aparentemente antagónicas tem a infeliz pretensão de se fazer passar por um retrato mais ou menos bem disposto de uma postura genuína perante o mundo.

Esta genuína boa disposição é no fundo um pretexto para emitir uma série de juízos normativos que não fazem outra coisa senão legitimar o sentido de uma felicidade vazia e, por isso, sem sentido. Num dos momentos mais importantes no desenvolvimento de Daisy, podemos ver este programa em ação de forma bastante convincente: para que Daisy reclame ou recupere alguma da sua agência sobre o mundo, Jay entrega-lhe um carrinho de supermercado, pedindo-lhe que faça compras e que traga aquilo que quiser do supermercado. Como não há capacidade para extrair uma nota de humor que seja de toda a situação (o “gag” resume-se ao facto de Daisy ter mais de 9 itens na caixa expresso), o resultado é catastrófico.

Que a encenação da conquista de uma certa emancipação psicológica seja feita a partir do consumo, pode muito bem ser consequência direta do lugar que a produção ocupa no mercado cinematográfico: mais uma entre tantas, anónimas e insignificantes.

O melhor: A banda sonora (Nick Waterhouse; Nick Drake): já se terá ouvido pior, apesar de tudo.
O pior: O Argumento.


José Raposo

Notícias