Aviso à navegação: quem viveu na época do primeiro Parque Jurássico dificilmente poderá ter qualquer tipo de compaixão por este protótipo tecnológico que se assume como um trivial produto de série B. Aliás, em 1993, a suposta série B revelou-se num dos mais entusiasmantes blockbusters dos últimos anos, um fascínio quase imaturo por bestas pré-históricas tecido com todos os traços do cinema de Spielberg ao serviço da adaptação do homónimo livro de Michael Crichton. Essa dita despretensão foi mais astuta e inteligente do que se julgava, obviamente se não seguirmos por “mesquinhez” científica.

Mas entre 1993 e o ano 2015, muito mudou nos parâmetros do entretenimento cinematográfico, e uma dessas mudanças adveio de um dos maiores “booms” da nossa cultura pop – os videojogos e como estes evoluíram – adquirindo uma linguagem complexa e provavelmente bastante cinematográfica. O cinema por sua vez influenciou-se dessa mesma linguagem, conduzindo-se por narrativas de rápido acesso e sequências de ação cada vez mais dependentes do frenesim tecnológico.

Mundo Jurássico vêm-nos concluir a promessa feita há vários anos atrás, um terceiro reencontro com o imaginário de Crichton que Spielberg orgulhosamente apresentou. Nesta nova estância, O Mundo Perdido: Jurassic Park (1997) e Parque Jurássico III (2003) são automaticamente anulados, seguindo diretamente a origem. Nesses termos, a visão Colin Trevorrow tenta diferenciar-se da fórmula estabelecida, mas o que consegue é puro espalhafato.

Vários anos depois dos eventos de Parque Jurássico, um novo parque é aberto na ilha Nublar, uma espécie de Disneyland com dinossauros. Com o passar dos anos, esse mesmo parque temático sempre gozou de um êxito surpreendente, mas os próprios dinossauros perderam o efeito de novidade para com o público, sendo a lufada de ar fresco encontrada pela gerência do Jurassic World de criar novas espécies geneticamente modificadas. Entre elas um apelidado Indominus Rex, um feroz carnívoro que cresceu como um animal inteligentíssimo, capaz de executar emboscadas e com o dom da camuflagem. Todos os pontos apontam para uma autêntica caixa de Pandora, e é previsível que o filme siga nessa vertente.

O resto é um branqueamento total da matéria primariamente exposta por Spielberg (presente aqui como produtor executivo). Parque Jurássico perdeu as suas influências do suspense e recebe com isso uma alegoria virtual e de cenas decorridas em velocidade recorde. Mesmo assim, Colin Trevorrow evidencia paixão pela matéria original, mas nunca total conhecimento pela mesma, ou seja, mimetiza entre espaços as referências do filme de 1993, intercalando com um pandemónio pré-histórico (o final é a certificação desse ato inconsequente) como se fosse uma criança ao qual foi dada total direção deste “projeto de sonho”. Perde-se a assombração que Spielberg auferiu na sua obra e com isso chega-nos uma veia sadista (aqui os dinossauros até brincam com a “comida”).

Mais, Mundo Jurássico funciona como um filme perigoso para os tempos que correm, até porque numa leitura mais aprofundada encontramos um entretenimento misógino. Falamos particularmente da personagem de Bryce Dallas Howard, uma mulher que profissionalmente está a acima de qualquer homem, mas isenta de vínculos afetivos e familiares. A dita torna-se aceitavelmente “humana” quando um “macho” arquétipo de Indiana Jones (Chris Pratt) surge na sua vida, salvando-a de todos os perigos e criando um elo de necessidade.

Nisto, o pior mesmo é o desleixo da produção para com a personagem de Omar Sy, o francês do sucesso Amigos Improváveis, perdido numa selva de animais extintos recriados graças a um CGI tão realista que nem uma criança de 5 anos consegue acreditar na sua existência. Com filmes assim, mais valia a extinção.