Sexta-feira, 19 Abril

«Manhã de Santo António» por João Carpinteiro

Manhã de Santo António estreia em conjunto com Hotel Mekong

Percebe-se a tentação de reunir na mesma sessão os filmes de Apichatpong e João Pedro Rodrigues (JPR). Para além da curta duração de ambos, pode dizer-se que o princípio operativo dos dois filmes – o quadro fixo – é semelhante. As semelhanças, no entanto, encobrem uma rasteira que a programação não soube reconhecer.

Ao passo que, em Hotel Mekong, o quadro fixo aprofunda o sentido das imagens – pelo conflito entre a ausência de movimento e o enquadramento do imaterial -, em Manhã de Santo António a imobilidade da câmara é apenas factor de afunilamento das imagens. O filme de JPR tem a espessura de uma anedota: um grupo de rapazes e raparigas zombieficados regressa a casa após a noite de Santo António, numa paródia aos santos populares – haverá sequer paródia? – que é perfeitamente unidimensional. Os planos picados sobre os jovens – não há personagens no filme – simulam, sem qualquer interrogação, as filmagens de um sistema de câmaras de vigilância – e o realizador podia ter-se detido aqui (por exemplo) e explorado essa possibilidade com alguma criatividade e empenho.

Mas não há humor no filme, nem ironia, nem tacto, nem espírito, nem carne, nem talento.

A metragem dos filmes é outra das rasteiras que passou despercebida à programação, e que motivou a sessão conjunta. Se em Hotel Mekong o tempo de filme depende – um pouco à imagem do que acontece com Pedro Costa – de um entendimento personalizado – e há poucos cineastas que ainda se dêem ao trabalho de reconhecer o tempo e a energia de cada plano -, a edição de Manhã de Santo António é esquemática e despersonalizada, e nunca varia a cadência imposta inicialmente. Como um metrónomo, JPR impõe às imagens a cadência rígida do corte, e perde a possibilidade de descobrir o sentido próprio de cada imagem. Fica a ideia de que o filme de Apichatpong tem uma hora porque foi durante esse tempo que as imagens fizeram sentido, ao passo que Manhã de Santo António parece ter estado programado, desde o início, para ter a duração que tem (25′).

E este é só um dos vários problemas deste filme.

Melhor: As estradas despidas de Lisboa durante a madrugada.
Pior: O registo anedótico, a falta de personagens, a falta de profundidade das imagens.


João Carpinteiro 

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