Sexta-feira, 19 Abril

«Capitão Falcão» por José Pedro Lopes

Apesar do marketing de Capitão Falcão o apresentar como o “primeiro super-herói português”, a realidade é que em altura alguma o filme tem aquele tom aborrecido de introdução que a onda de produtos de super-heróis atuais costumam ter: o filme de João Leitão capitaliza todo um imaginário coletivo sobre o que é ser português, as vicissitudes da nossa história e, mais surpreendentemente, o que é o espírito, não só da geração lusa dos anos 60, mas também da atual. O Estado Novo aqui não está a ser revisto, nem com saudosismo, nem qualquer agenda politizada, mas sim pelos olhos de uma geração que já se pode rir dele à distância e criar assim uma peça de entretenimento tão invulgar como descontraída.

Passado no final dos anos 60, o filme apresenta-nos Capitão Falcão, o grande defensor do Estado Novo e de Salazar, cujo único “super-poder” na realidade é o facto de ser português e masterizar a arte de desenrascanço. Falcão enfrenta aqui a crescente onda de comunismo em Portugal e tenta desvendar qual é o plano que os Capitães de Abril, um gangue de malfeitores (com trajes coloridos reminiscentes dos “Power Rangers“), têm para o nosso país.

De sequência cómica em sequência cómica, Capitão Falcão joga a seu favor ser um filme da tal “era ingénua” do Estado Novo, mas feito nos dias de hoje: a aposta é tanto em comédia visual (as duas investigações ao Banco de Portugal) e física (com momentos de luta hilariantes coreografados por David Chan), como no carisma das suas personagens (a sequência da prisão). O filme consegue de forma genial inserir apontamentos de comédia de temática “à priori” sensível: a sala riu em uníssono com a apresentação do Capitão Preto ou com as atitudes machistas do seu protagonista (afinal, não há mesmo nada mais perigoso que uma mulher que pensa que é um homem).

Capitão Falcão cumpre assim o prometido há já vários anos quando o seu trailer se tornou um sucesso viral na Internet e quando a sua versão “curta-metragem” fez furor no Motelx e no Shortcutz: é um filme português e bem português, mas é também um filme de entretenimento completo, capaz de satisfazer o público juvenil e adulto, dos mais habituados a ver cinema nacional aos mais céticos. É que este Capitão Falcão – genialmente interpretado por Gonçalo Waddington com uma grande bigodaça – pode ser divertido, conservador, gostar de comer bacalhau com vinho tinto (!) e dizer que é “muito perigoso”, mas é acima de tudo um filme excelente por si próprio – português ou não.

O melhor: O Estado Novo revisto pela geração atual de uma forma divertida e sem pudores.
O pior: O primeiro ato demora um pouco a acertar o ritmo.


José Pedro Lopes

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