Quinta-feira, 25 Abril

«The Voices» (As Vozes) por José Raposo

Imagine o leitor que ouvia vozes. Não as do costume, mas as dos seus animais de estimação. No melhor dos cenários, os comprimidos que a psiquiatra do costume lhe prescreve encerram o assunto; na pior das hipóteses, se em vez de seguir os conselhos médicos resolver antes dar ouvidos ao gato, o mais provável é acabar os seus dias a rechear o frigorífico lá da casa com cabeças decepadas.

É mais ou menos esta a premissa de As Vozes, o novo filme realizado por Marjane Satrapi (a mesma autora e co-realizadora de Persépolis), uma comédia negra com Ryan Reynolds (Jerry) no papel de um funcionário de uma empresa que produz banheiras. Com um passado marcado por traumas que o perseguem no quotidiano, Jerry não é exatamente um sucesso nos seus avanços com as colegas de trabalho. Os pensamentos homicidas que lhe são incutidos por Mr. Whiskers, o gato (é sempre um gato!), não ajudam muito ao caso: o resultado não poderia, de fato, ser outro senão uma comédia negra dada ao absurdo.

Satrapi sabe exatamente ao que vem, e o cruzamento de humor com tons de horror tem demonstrado ser capaz de despertar algum interesse. Mas As Vozes não vêm trazer nada de novo ao género, e algumas das ideias mais interessantes vêm sempre de outras paragens. A fábrica de banheiras (cor de rosa) transporta consigo aquele ambiente de não lugar muito evocativo do cinema de Tim Burton; e as situações mais grotescas, embora sejam capazes de cumprir o seu propósito (para os aficionados do género é sempre interessante ver uma enorme quantidade de tupperwares empilhados cheios de tripas), nunca vão muito além da sua condição ornamental. 

Os momentos mais conseguidos acabam por derivar mais da performance dos atores e não tanto por méritos de guião. Ninguém acreditará que a performance de Ryan Reynolds faz realmente lembrar o Norman Bates de Psico, mas não há grandes duvidas que a momentos o maneirismo de Perkins lhe serviu de modelo (a ele, e a toda a gente, o que só reforça a natureza derivativa de tudo isto). Mas ainda quanto ao casting, talvez a grande surpresa seja mesmo a presença de Anna Kendrick, no papel de uma das colegas de trabalho de Jerry, uma atriz que por estas alturas deveria andar por outras paragens. É bem possível que a própria Kendrick não saiba muito bem como foi ali parar: culpa das vozes?

O melhor: Ryan Reynolds
O pior: Já vimos isto.


José Raposo

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