Sexta-feira, 19 Abril

«Duran Duran Unstaged» por Roni Nunes

Fenómeno não muito raro é uma banda popular e “comercial” com o passar dos anos emigrar para o universo cult. Assim, os Duran Duran, orgulhosamente desprezado por todo o apreciador de rock alternativo nos anos 80 chegam à nova centúria com o referido estatuto. E daí que o casamento do grupo com o maluco predileto do cinema indie, David Lynch, não soe tão estranho quanto poderia parecer.

Na verdade, se os DD nunca fizeram uma música transcendente, o seu bom gosto, que pode ser depreendido das covers aceitáveis que fizeram para obras de mestres como David Bowie, Roxy Music, Velvet Underground e até Led Zeppelin (!), sempre foi notório. Na mesma linha, um dos grandes momentos, se não o melhor, deste concerto ocorrido em 2011 e transmitido em simultâneo no Youtube, é a passagem fulgurante de Beth Ditto, dos Gossip, a cantar Notorius ao lado de Simon Le Bon.

De resto, a música é o que fica mesmo deste filme, com o grupo a desfilar com uma energia assinalável canções do seu álbum daquele ano, All You Need Is Now, e mais alguns clássicos da sua carreira – onde, curiosamente, Save a Prayer ficou de fora. No mais, é óbvio que estes dandies de Birmingham – que aqui surgem com Le Bon a esconder bem a idade com uma barba, ao contrário do ídolo das meninas John Taylor, com pés-de-galinha bem visíveis – continuam a ser o que sempre foram, uma banda pop. Isto fica claro nos diálogos ensaiados, numa mise-en-scène onde nada destoa e onde a possibilidade, prometida por Lynch no início, de acontecerem “imprevistos”, é inexistente.

O cineasta acaba, aliás, por contribuir com o ponto mais baixo deste Unstaged, quando surge no início do filme numa “estação espacial” a falar dos sonhos que a música dos Duran Duran lhe despertam com a espontaneidade de um ator da TVI. Os “acidentes” de percurso ficam-se mesmo pelos efeitos nas imagens que equivalem a rabiscos que o agora artista plástico abstrato Lynch utiliza para pontuar as performances.

Nesta via, ele dá-se mesmo ao luxo de arruinar o imaginário do espetador com o anticlímax que é selecionar para contraponto visual da atmosférica Come Undone imagens repetidas de… salsichas num grelhador! De forma geral, fica-se com uma construção visual que raramente acrescenta algo de utilidade para a música.

O MELHOR: a música
O PIOR: o design visual de David Lynch nunca o torna numa experiência de valor em si


Roni Nunes

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