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«Virados do Avesso» por Hugo Gomes

Experimental e bastante ativo na indústria cinematográfica, Edgar Pêra recorre agora a uma vertente mais comercial do que o habitual (se cairmos na prenoção de que a comédia como género é exclusivamente direcionado ao grande público) para nos transmitir o seu filme mais vulgarizado e menos pessoal.

A burlesca história de um homossexual que acorda certo dia sem ter noção da sua orientação sexual é já por si só meio caminho andado para mais uma anedota de género, mas Pêra trabalha na essência kitsch e no tom de comédia screwball. Por pouco existiriam aqui contornos do cinema de Almodóvar, para conduzir um filme de vasta viabilidade e de uma certa renegação da linguagem televisiva.

Diria antes, e voltando a referir o primeiro ponto, que encaramos este filme como um ensaio com escassos elementos da sua cinematografia, tirando obviamente da decisão do som de pós-produção, numa sequência com a sua marca autoral nas transposições visuais que deparamos lá para o final e Nuno Melo, aquele que tem servido durante grande parte da sua carreira como o seu molde humano. A verdade é que é o ator, que já havia vestido a pele do tenebroso Barão, a garantir grande parte (arriscaria a sublinhar a totalidade) das gargalhadas concentradas em todo o desenrolar da fita. Ele é o comic relief por natureza, e o trunfo na manga de Pêra nesta paródia que incentiva romper julgamentos populistas e preconceitos estabelecidos.

Virados de Avesso é um filme, que apesar do esforço, não consegue incentivar o espectador a seguir uma narrativa mais preocupada nas referências culturais e sociais do que nomeadamente nas personagem. Aliás, estas, meras caricaturas estereotipadas movidas por overacting sobre overacting, que nem mesmo Diogo Morgado escapa. Contudo, a homossexualidade no novo filme de Edgar Pêra está longe de ser apresentado sob tabus, mas não evita de ser uma prolongada gag cartoonesca, com menos graça do que aquilo que se imaginava ou do que fora prometido.

O melhor – Nuno Melo, a renegação dos ditos “tiques” televisivos que já parecem incontornáveis no cinema português comercial
O pior – as piadas arrastadas de estereótipos e preconceitos. São gastas. Os desempenhos são desvanecidos pelo constante overacting.


Hugo Gomes