Sexta-feira, 19 Abril

«Miss Julie» por Jorge Pereira

Nesta enésima adaptação da peça de August Strindberg, considerado um dos pais do teatro moderno, a eterna musa de Ingmar Bergman, a atriz Liv Ullman, agarra-se ao texto original de tal maneira que mesmo mudando a localização para a Irlanda, cria uma obra profundamente teatral, muito mais que, por exemplo, a versão mais cinemática e livre de 1951, assinada por Alf Sjöberg.

Com um início romântico, uma transformação naturalista e um envelhecimento que abria portas ao expressionismo, Strindberg aplica muitas das ideias da teoria evolucionista de Darwin nesta sua Miss Julie (Fröken Julie), nomeadamente a sobrevivência do mais apto, aqui aplicado às classes sociais e ao sexo, e refletido nas personagens de Julie (Jessica Chastain), uma aristocrata, John (Colin Farrell), um servente, e Kathleen (Samantha Morton), a cozinheira e noiva envergonhada de John. E não vamos esquecer o barão, que nunca surge em cena, mas cujas botas plantadas na cozinha o transformam numa presença omnipresente. 

É contudo na interação dos três (Julie, John e e Kathleen), na interpretação dos atores e nos diálogos de Strindberg que o filme se movimenta e apesar dos esforços do cinematografo Mikhail Krichman em dar uma beleza e olhar cinemático aos eventos, a verdade é que tudo o que vimos podia praticamente ser feito num palco, até porque mais de 80% do filme decorre numa cozinha e num quarto e as cenas exteriores são extremamente limitadas, embora representem dos momentos mais importantes e belos do filme.

Como seria de esperar, pela força do texto, as prestações dos atores eram fundamentais para o sucesso deste Miss Julie. Se Farrell e Morton cumprem de forma exemplar com as suas personagens, é em Jessica Chastain que o filme ganha uma nova dimensão, mostrando porque esta é claramente uma das atrizes mais impactantes do cinema norte-americano atual. O último terço, que exigia uma carga dramática muito superior devido à desgraça e desonra que se lhe abateu em cima, mostra uma Chastain fulminante e hiper expressiva, demonstrando que ela é mesmo uma das maiores razões para ver este filme.

O Melhor: Jessica Chastain e o texto original de Strindberg
O Pior: A abordagem de Ullman não é de todo a melhor para uma obra cinematográfica


Jorge Pereira
(Crítica originalmente escrita em novembro de 2014)

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