Quinta-feira, 28 Março

«Sarah Préfère la Course» (Sara Prefere Correr) por Duarte Mata

Sara tem vinte anos. Antissocial e sorumbática, treina intensivamente pela sua única paixão: a corrida. É uma atleta ambiciosa, disposta a deixar a mãe e a concordar num casamento por conveniência, só para seguir o seu sonho numa faculdade em Montreal. Na pista, é dominadora do seu próprio destino. Fora dela, está sem rumo. Até lhe ser diagnosticado um problema cardíaco que pode (ou não) levá-la a abandonar o seu único propósito de vida.

Sara Prefere Correr é a primeira longa-metragem da canadiano Chloé Robichaud. Realizadora, argumentista e (coisa rara) produtora executiva, dirige um filme que não se exprime tanto por palavras, mas por pequenos enigmas. Como as sugestões homoeróticas da sua personagem principal, na maneira como esta olha para as suas colegas no balneário ou a incapacidade de obter prazer sexual com o seu companheiro de quarto. Mais do que isso, a cena em que aceita fazer parte de um casamento forjado com este último é encenada filmando os reflexos das personagens numa janela escura, dissimulando os sentimentos das mesmas. Estas incertezas recorrendo apenas a dispositivos cinematográficos são, em simultâneo, o progresso da narrativa e a sua interpretação.

Por vezes previsível – claro está que o primeiro conflito é com a mãe que não acha piada nenhuma a esta história de corridas, fora a incerta condição física da qual Sara padece – acaba por ter um final que a história (ou o nome dela) pede e que a audiência há muito adivinhou. Em compensação, a mesma relação é descrita por meias-palavras e nunca plenamente explicada. As cenas de corrida / aquecimento são as mais interessantes, metáforas da fuga escapista de tudo o que Sara conhece, sendo este filme, de certa forma, não um Momentos de Glória, mas antes um De Tanto Bater o Meu Coração Parou (em título e personalidade) pouco épico, mas muito humano, não sobre uma competição mas antes a paixão por ela, com temas como o livre-arbítrio e a condição humana explorados de forma ambígua.

Uma corrida para a vitória de Sophie Desmarais no papel principal e um filme novato de auteur, contado num estilo confiante que deixa a expetativa em filmes vindouros da sua cineasta.

O melhor: As ambiguidades deixadas sobre a personagem principal.
O pior: Por vezes previsível, principalmente o final.


Duarte Mata

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