Quinta-feira, 25 Abril

«The Giver» (The Giver – O Dador de Memórias) por Duarte Mata

Está mais que excruciada esta nova tendência do livre arbítrio de adolescentes prevalecer sobre uma sociedade nada utópica, plagiada das páginas do Admirável Mundo Novo de Huxley e 1984 de Orwell. Em The Giver – O Dador de Memórias o pior é que, para além de copiado, nem sequer é credível.

É sobre um jovem (Brenton Thwaites) que escapa a um sistema que droga os seus habitantes, inofensivos e privados de conhecimento, ao ser-lhe conferido o cargo de “Receptor”, ou seja, um guardião da ciência e das mais humanas emoções (amor, ódio, etc.) dos quais que a civilização foi privada. Claro está que o objetivo do protagonista passa então a ser terminar o regime opressivo, partilhando a sabedoria a que teve acesso e libertar a sua cidade deste cativeiro inconsciente e apático.

Como dizíamos, a credibilidade é por nós referida contra algumas das sequências irrealistas e enfadonhas que existem apenas para “encher o olho”, nomeadamente, o mergulho e sobrevivência de um bebé de uma altura de cem metros ou a sua perfeita saúde depois de estar horas exposto a temperaturas álgidas. Mas há mais que apontar como defeitos aqui. Os atores adolescentes (Thwaites, Odeya Rush e Cameron Monaghan), se bem que possa ser essa a intenção deste trabalho, são inexpressivos e descuidados, de tal forma que nos repele a ideia de chamar ao que fazem de “representação”. Jeff Bridges (no papel do “Dador” do título), Katie Holmes e Meryl Streep existem apenas para chamar a atenção no material publicitário e são desaproveitados, sem nada a que se possa chamar de profundidade.

Blockbuster exíguo e mais que previsível, com um uso de música enjoativo e componentes técnicas um pouco amadorísticas (boa parte do filme é passada num preto-e-branco conferido por um desses programas de edição que já vêm no sistema operativo) e realização e argumento formatados, é outro discípulo da receita dos estúdios americanos (olha o interesse amoroso de olhos claros, olha a manda-chuva/má da fita, olha o mentor/figura paternal do miúdo), insípida e defeituosa, numa “xaropada” sobre os temas recicláveis do ser-se humano e que, afinal, o amor justifica mesmo toda a existência de ódio e dor que há pelo mundo.

Ficam as saudades desse filme notável (imperfeito, é certo, mas ainda assim bastante reflexivo) do final da década de 90 chamado Gattaca que, desastrosamente, tem tido uma sucessão corruptível de filhos pródigos onde The Giver recai como a mais recente aquisição.

O melhor: A nostalgia que deixa de Gattaca.
O pior: O meio que segue para esse fator, ou seja, existindo.


Duarte Mata

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