Sexta-feira, 19 Abril

Bethlehem (Belém) por Hugo Gomes

Com Israel a ser “apedrejado” em plena praça pública, Belém estreia em Portugal sob um mau “timing“, provavelmente prejudicial para que seja fruto de apreciação por parte dos espectadores menos imparciais. Contudo, não pensem que tudo passa de um mero oportunismo falhado por parte da distribuidora ou algo do género. A primeira obra do israelita Yuval Adler tem as suas virtudes no enredo e, melhor, sabe conduzir este sem nunca tropeçar em “maniqueísmos” nem julgamentos desiguais.

Primeiro porque Belém comporta-se naquilo que exactamente é, um thriller policial com mais aspirações para as séries televisivas do género do que propriamente um filme de denuncia e com ácidas reflexões sociais e éticas. Segundo porque é demasiado nervoso para ser levado a sério nesse sentido. Belém remete-nos uma panóplia de dicotomias de carácter ético e sentimental, mas sem nunca intensificar tais na sua intriga.

Trata-se antes de um filme sobre as consequências dos atos e, em derivação disso, um protagonista, Sanfur (Shadi Mar’i numa forte entrega), que passa mais tempo a questioná-las do que supostamente a interagi-las. Ele é um jovem palestino, irmão mais novo de um dos mais temidos e procurados militantes da região, que para além disso coopera com as autoridades israelitas na sua captura enquanto que afasta estes de realmente “apanhar” o seu ente querido. Sanfur é assim o peão neste jogo que o desafia a escolher um lado no conflito interno, lançando-se em dilemas do seu sangue, da sua bandeira e na outra face da moeda, do afeto paternal do seu “tutor” israelita, um sentimento que não vimos no seu pai biológico.

A demanda do jovem é acompanhada e permane até ao último segundo de fita. Até lá é o “pastiche” que se confirma, aquilo que já presumíamos mesmo antes do encontro com a obra. A mercê disto são os constantes tiques televisivos que se concentram e atenuam qualquer intensidade na ênfase dramática de Belém, sendo tudo registado num amorfismo quase avassalador.

A falta de “reais” personagens secundárias e os sub-enredos sem potencial (já que a produção assenta nos toques de neorealismo para se proferir nesses aspetos) são outras das fraquezas com que nos deparamos. Na realidade, Yuval Adler tem ideias, mas não tem “unhas” para tocar a guitarra. Quanto ao timing referido e as influências da atualidade, não se preocupem pois Belém é devidamente ambíguo.

O melhor – a intriga principal e a entrega de dicotomias
O pior – a realização meramente televisiva


Hugo Gomes

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