Marion Cotillard é uma “alien”, não no sentido literal da palavra, mas em termos figurativos. Ela é uma estranha no Novo Mundo, guiada por promessas de prosperidade e de novas oportunidades. Porém, a terra dessas tais promessas revela-se desde o primeiro momento como um poço de enganos, um comparado inferno em que cada individuo torna-se no próprio Diabo, entregando falsas juras e entrando em jogos mal amparados que “crucificam” vidas e as condenam a um labiríntico limbo. O que viveu a personagem de Cotillard é um espelho vivente de milhões de “cegos” que partiram desesperadamente nessa demanda e cederam aos recantos mais negros do oportunismo humano, mas no filme de James Gray o foco é ligeiramente diferente, tal como o tom com que este debruça a miséria social.
A Emigrante é, até à data, a mais ambiciosa das obras do referido realizador, um homem estimado por muitos mas indiferente para outros (Gray não tem fervorosas legiões de ódio). Na verdade, esta é uma falsa epopeia que é decepada por moldes narrativamente classicistas e é sobre esse tom académico que nos pavoneia um enredo tecnicamente sedutor e com prestações cuidadas por parte do seu elenco. O resultado, contudo, é um filme isento de impacto e, pior, de frontalidade.
Gray, em conjunto com Ric Menello, escreveu uma história cenicamente “míope” recheada de personagens ambíguas condenadas a justificar os seus atos para que não haja ódios por parte do público. Em consequência disso, sente-se uma necessidade de antagonismo. O maniqueísmo é deixado de lado e abalroado astutamente pelo enredo mas – por conseguinte – surge outra necessidade: a de um conflito interno, talvez uma evocação existencialista por parte da personagem de Cotillard e dos seus trilhos duvidosos. Mas nem isso chegamos a saborear.
A prova dessas “ausências” é que, com a chegada do final, abruptamente feliz, parece que todo o caminho da protagonista até ao eventual desfecho decorreu com a menor das preocupações, o menor esforço e veracidade. O resultado é uma novelesca obra que recusa inicialmente ser aquilo que verdadeiramente é: um filme tecnicamente irrepreensível (a fotografia de tons pálidos alude a uma fotogenia antiga e obsoleta como a do O Padrinho de Coppola) mas dramaticamente é um trabalho gasto e narrativamente formatado.
Enquanto isso, as prestações são de inegável qualidade. Joaquim Phoenix afirma-se mais uma vez como um dos melhores da sua geração e Marion Cotillard transmite a credibilidade que nas mãos erradas soaria a falso. Por fim, Jeremy Renner completao trio de forma competente, mas como uma figura dispensável, inútil para a narrativa e sem indícios de interesse na sua exploração por parte do realizador e argumentista.
Concluindo e resumindo, A Emigrante é um espetro de uma grande obra, valorizado pela ideia e pelos seus riscos de produção, mas “desmembrado” por um pretensiosismo anorético, uma evidencia já comum na carreira de James Gray. Enfim, mais uma oportunidade desperdiçada!