Sábado, 20 Abril

«Viva la libertà» (Viva a Liberdade) por Roni Nunes

Só mesmo um lunático para sacudir o lodoso pântano da política italiana, um cenário, aliás, facilmente transponível para a realidade portuguesa. A oposição de esquerda está num estado deplorável: o seu líder, Enrico Oliveri (Toni Servillo), está a ser atacado por todos os lados e, principalmente, pelos seus colegas de partido. Em vez de reagir, ele vive o dia-a-dia numa espécie de catatonia da qual só desperta para desaparecer a meio da noite!

Mau com ele, pior sem ele, o seu dedicado secretário, Andrea Bottini (Valerio Mastandrea), tem de encontrar uma alternativa, que lhe aparece por acaso da forma mais inesperada: o irmão gémeo de Enrico, Giovanni, recentemente liberado de um hospício. Tomando o lugar do irmão com grande energia e assertividade, dizendo as verdades que os políticos costumam evitar, ele torna-se um sucesso.

O melhor deste “Viva a Liberdade” é encontrar algo além da facilidade com que cria uma empatia natural com o espectador numa altura em que o desprezo pelos políticos é global, particularmente numa Europa tomada pelo mais completo vazio de ideias.

Mais do que isso, Roberto Andó cria um filme que, mesmo ao garantir gargalhadas e jogar no conhecido terreno da troca de papéis, foge à mera caricatura com diálogos de grande inteligência (alguns brilhantes), onde as políticas italiana e europeia são fortemente atacadas naquilo que têm de mais profundo – a sua incapacidade de esboçar qualquer reação, de trazer qualquer novidade. Óbvio que o fantasma do deprimente Sílvio Berlusconi paira sobre o filme (sem que precise ser mencionado).

Cinematograficamente é menos exuberante, com um ritmo nem sempre equilibrado e soluções visuais pouco imaginativas. Mas, para além de ser mais um ponto para Toni Servillo depois do fabuloso A Grande Beleza, o filme é uma sátira acima da média e terrivelmente conectada com a noite negra da política europeia.


Roni Nunes
(Crítica originalmente escrita em abril de 2014)

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