Quinta-feira, 28 Março

«When Evening Falls on Bucharest or Metabolism» (Quando Cai a Noite em Bucareste ou Metabolismo) por Roni Nunes

O realizador romeno Corneliu Porumboiu partiu de premissas aparentemente simples para propor o seu filme sobre cinema: dois tipos de abordagens. Numa delas, conversas aparentemente despretensiosas são proferidas num carro em movimento, onde Bucareste surge ao fundo em permanente fora de foco. A fazer uma espécie de revezamento esquemático com estas, planos fixos flagram almoços, ensaios…e mais almoços – quase sempre em torno de apenas dois personagens, o cineasta Paul (Bogdan Dumitrache, protagonista também de “Mãe e Filho“) e a atriz do filme que está a rodar, Alina (Diana Avramut).

Enquanto o metabolismo tão invisível quanto a noite de Bucareste vai se processando, fica-se a saber que Paul tem severas dúvidas sobre o futuro do cinema na era digital. O problema: a alteração do tempo. Lá pelas tantas, também é relevante saber que a jovem Alina nunca tenha ouvido falar de Michelangelo Antonioni!

Mas Porumboiu, que utiliza-se dos recursos para dialogar com as ideias de Paul, não gasta mais película sobre um discurso conceitual a propósito do cinema. Antes disto, vai subtilmente entrelaçando os rumos do romance sem futuro dos dois com um comentário bastante mordaz do que se passa por trás das câmaras – a vaidade, o egocentrismo e o utilitarismo descarado com que as pessoas usam umas as outras para obter favores. Neste sentido, a mais cínica e divertida sequência do filme é um almoço do casal onde junta-se a eles um segundo cineasta, aparentemente de igual estatuto ao primeiro – e cujas tensões, ciúmes e flertes são escancarados – embora sempre nas entrelinhas.

Cabe a personagem de Alina garantir com a sua natureza pouco reveladora os melhores momentos desta construção, onde Paul vai se enredando até perder o controlo do relacionamento que, afinal, só na aparência era inócuo. Mas resta-lhe o poder do realizador, que não deixará de usar para refazer a sua história. Para uma obra quase esquemática, nem todas as cenas e diálogos têm o mesmo nível de interesse, mas no todo é um filme estimulante, subtil e irónico – e onde a discussão sobre a natureza das imagens em movimento até inclui… uma endoscopia!

O Melhor: a sutileza com que entrelaça vida real e cinema, para além da ironia
O Pior: nem todas as sequências e diálogos têm o mesmo nível de interesse


Roni Nunes
(crítica originalmente escrita em novembro de 2013) 

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