Quinta-feira, 25 Abril

«La Vénus à la Fourrure» (Vénus de Vison) por Roni Nunes

Em Lua de Mel, Lua de Fel, filme que Roman Polanski lançou em 1992, uma intimidante Emmanuelle Seigner retornava para o seu pobre marido, Peter Coyote, depois de um período de desaparecimento da vida dele. Sardonicamente, avisava-o de que tinha duas notícias para lhe dar, uma boa e uma má. Uma das novas era o anúncio de que ele, que acordava de um acidente, tinha ficado paraplégico. “E qual é a boa?“, pergunta ele. Resposta: “Não, essa era a boa. A má notícia é que eu voltei“.

Esse diálogo e aquilo que se segue depois estão em sintonia direta com o último trabalho do cineasta, remetendo a um remoto lugar na sua mente onde residem fantasias de dominação feminina e um quase ritualístico jogo de poder e tortura, física e psicológica (algo que ele também retoma de outra forma em A Noite da Vingança). Aqui, a aproveitar a matéria-prima de uma peça teatral baseada em Sacher-Masoch e o seu famoso Venus in Furs, que legaria à história o termo sadomasoquismo, esse é mesmo o tema central.

Repleto de metalinguística, Vénus de Vison é mais um filme (relembre-se o lançamento na última semana de De Bicicleta com Molière), focado no trabalho de dois atores e centra-se exclusivamente num ensaio onde o encenador Thomas (Mathieu Amalric) procura e, para sua infelicidade, encontra, uma atriz perfeita para o papel de Wanda, antagonista do personagem principal na peça. O jogo de dominação que se estabelece entre ambos perde rapidamente a subtileza, passando de uma guerra aberta entre uma atriz rude e inculta, mas repleta de sensualidade e intuição, e um realizador reprimido e subitamente em apuros ao tornar-se cada vez mais exposto a um confronto onde começa claramente a perder o controlo.

Tal como no citado filme de Phillipe Le Guay, esta é uma daquelas obras feitas sob medida para um ator mostrar tudo aquilo que vale. Depois de O Escafandro e a Borboleta ninguém duvidaria da capacidade da dupla de protagonistas, especialmente de Amalric. Neste sentido, acaba por ser Seigner, agora com 47 anos, a grande surpresa – naquele que será muito provavelmente o seu melhor desempenho como atriz. Embora numa partida onde todos os elementos são facilmente identificáveis e relativamente previsíveis, a obra cumpre, no entanto, precisamente aquilo que se espera: é divertida, sensual, inteligente e, eventualmente, sarcástica. Mas vem deste atributo aquele que é o maior pecado do filme, um final demasiado satírico, que compromete a construção detalhada e séria do restante.

O Melhor: é um filme para os atores brilharem, coisa quem ambos fazem
O Pior: o final demasiado satírico


Roni Nunes 

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