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«Interior. Leather Bar.» por André Gonçalves

As temperaturas podem estar a arrefecer cá fora, mas dentro do Cinema São Jorge, neste 5º dia do Festival, de um ponto de vista sexual, elas permaneceram bem altas.

O mundialmente reconhecido James Franco, que já tinha interpretado Allen Ginsberg (em O Uivo), que já tinha simulado sexo oral com uma arma numa das cenas mais icónicas de Spring Breakers e que já tinha andado a brincar com os media ao passear-se pela cidade aos beijos com uma figura masculina de cara tapada, tem aqui talvez o seu projeto mais “hardcore”. No fundo, é um mero apadrinhamento – como me disse alguém próximo e bem, pois duvida-se que Franco tenha passado assim tanto tempo no “set“, e muito menos sóbrio.

Interior . Leather Bar pode ser descrito como um ensaio queer sobre os caminhos que este cinema pode ainda percorrer, onde o próprio Franco discursa como se tivesse acabado de ler uns calhamaços de “Teoria Queer“. Como ponto de partida para novos debates sobre pornografia vs. arte, ou do uso desta como meio válido de contar histórias (e de propagá-la no futuro para o circuito comercial), é um bom instrumento. Como objeto cinematográfico, como híbrido entre documentário e ficção, com meta-narrativa e isso tudo, é menos surpreendente e mais inofensivo do que se acha.

Tendo como ponto de partida uma reimaginação dos 40 minutos que foram cortados do polémico A Caça de William Friedkin e que ninguém os consegue ter mão atualmente, a meta acaba por ser uma brincadeira de bom ou mau gosto (dependendo do espectador) sobre um grupo de atores amadores, um deles, o alvo principal, um “grande amigo” de Franco. Contei duas cenas supostamente refilmadas, não mais que 10 dos tais 40 minutos inicialmente cortados. O que me fez pensar que Interior. Leather Bar pode ser visto como uma versão mais profissional e convincente de uma curta portuguesa que passou há uns anos atrás, um suposto documentário sobre uma curta falhada, intitulada 10 Dias Sem Bater

Claro que aqui o “payoff” da brincadeira encontra-se a uma escala, claro que o sentido de auto-ironia aprecia-se (com os atores constantemente a perguntarem-se uns aos outros qual o sentido daquilo tudo), mas no final a sensação é de que fomos enganados – bem ou mal, fica à decisão de cada um.


André Gonçalves
(Texto originalmente escrito durante o Queer Lisboa 17)