Sexta-feira, 29 Março

“Oblivion” (Esquecido) por Roni Nunes

A Terra foi devastada em 2017 por alienígenas que, após destruírem a Lua e causarem toda a espécie de cataclismas naturais, ocuparam o planeta. Os humanos venceram, mas para isso tiveram que usar bombas nucleares. Como resultado, os sobreviventes tiveram que emigrar para outro planeta, mas deixando antes uma sofisticada forma de extrair água para encaminhá-la para o seu novo habitat (através dos “drones”).

Sessenta anos depois, Jack Harper (Tom Cruise) é um técnico cuja missão é garantir o correto funcionamento dos “drones”, seguidamente vítimas de ataques de uns misteriosos seres chamados “predadores”. Ao mesmo tempo, ele vive uma espécie de idílio afetivo com a sua partner de trabalho Victoria (Andrea Riseborough, subtilmente magnífica). Tudo seria perfeito, não fosse Harper sofrer de “lapsos” onde lembra-se de coisas que era suposto ter esquecido após o apagamento da memória que sofreu para desempenhar esta missão.

Tudo isso fica-se a saber nos primeiros minutos do filme. Mas há muito, muito mais para acontecer. A partir de uma exploração quase minimalista deste ponto de partida, Joseph Kosinski (“Tron”) vai construindo uma história densa e repleta de interesse. Ainda antes de se ter resolvida a questão dos predadores, e já um novo e insondável mistério acrescido – o da sobrevivente (Olga Kurylenko) de um grupo de humanos “caídos do céu”.

No mais, há um pouco de tudo neste “Esquecido”. O grande Philip Dick, que tanto se debruçou sobre a questão de quanto a memória determina a individualidade (a questão fundamental de “Blade Runner”, por exemplo), ganha aqui uma “releitura” bastante curiosa pois, se por um lado a memória é mesmo determinante, por outro pode ser reproduzida tantas vezes quanto se queira. Esta é a porta de entrada não só para se entender a resolução do enredo, mas permite outro simbolismo – o do homem em conflito consigo próprio (a luta entre os duplos). Ao mesmo tempo, paira sobre as cabeças dos sobreviventes as conspirações distópicas (incluindo um super computador que remete tanto a “2001 – Uma Odisseia no Espaço” quanto a “Matrix”) com os seus rebeldes.

Por outro lado, se em “Fahrenheit 451” (o livro ou o filme) o mundo ficava à mercê de um poder totalitário devido à queima dos livros, é um exemplar destes que, não só desperta a verdadeira natureza de Harper, como muda completamente o rumo dos acontecimentos. Por fim, resta ainda uma curiosa simbiose com “Os 12 Macacos”, onde o que se comemorava, no fundo, era a existência e a perfeição do nosso planeta (aqui simbolizada pela casa entre as montanhas) – alertando para um tempo onde é ainda é possível salvá-lo.

Estas referências são qualquer coisa, mas também não são tudo. “Esquecido” é uma obra com vida própria, que abdica de tudo o que é supérfluo, mesmo quando os seus caminhos tornam-se mais complexos, preocupando-se mais em desenvolver a história do que com cenas de ação. O filme não chega a entrar em grandes voos filosóficos ou existenciais para tornar-se um clássico (quem sabe…?), mas depois de tantos abusos, efeitos visuais, monstros e criaturas, já não era sem tempo que alguém devolvesse poesia e simplicidade ao género.

O Melhor: uma boa história de ficção científica
O Pior: não chega a ter elementos particularmente inovadores


Roni Nunes

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