Quinta-feira, 28 Março

Entrevista Queer Lisboa 2016: “O Ninho”

Depois de percorreram um surpreendente circuito com seu trabalho de estreia, Beira-Mar, um filme intimista que estreou no Festival de Berlim e seguiu pelos festivais mundo afora, Filipe Matzembacher e Márcio Reolon dedicaram-se a um projeto televisivo local – em Porto Alegre, no sul do Brasil.

O Ninho, onde estão de alguma forma presentes o intimismo e a questão da identidade que caracterizava o trabalho anterior, avança no sentido de uma militância social ao retratar uma espécie de “família” de homossexuais marginalizados na sua cidade. A minissérie teve quatro capítulos, apresentados na íntegra pelo Queer Lisboa em sessões dias 21 e 23.

O C7nema conversou com Filipe Matzembacher a propósito dos novos temas e da pressão do sucesso do filme anterior na concretização do próximo trabalho da dupla…

Em O Ninho vocês retomam em parte uma das principais questões de Beira-Mar, que era a da identidade. Mas, ao mesmo tempo, não é um projeto puramente intimista – mas traz antes um caráter até de militância social…

Nós acreditamos que ambos os projetos tem uma vertente política. Beira-Mar era um filme sobre amadurecimento e sobre reconhecer-se individualmente e intimamente – o que te torna uma pessoa mais completa e confiante. O Ninho, todavia, coloca o indivíduo em uma busca por comunidade. Na série exploramos a procura de Bruno por uma família em uma sociedade que o rejeita. E acredito que o tom mais “combativo” ajuda a dar esse clima mais político e de luta. O Ninho é sobre se reconhecer e sobreviver em uma sociedade que o rejeita, buscando pessoas semelhantes a você.

Tal como em Beira-Mar vocês trouxeram, novamente, interpretações naturalistas. Às tantas o registo é quase documental…

Nos interessa bastante esse registo. No caso de O Ninho trouxemos vários não-atores para contracenar com atores, que acabou gerando uma dinâmica maravilhosa no set de filmagens. O argumento foi se apropriando da vida desses “não-atores” e, portanto, há diversos momentos em que eles estão ali por completo, sendo eles mesmos. Foi um grande trabalho de pré-produção mas que gerou um resultado que gostamos bastante.

No ano passado vos preocupava o facto de no Brasil os debates sobre a questão LGBT estarem polarizados. Mas se há radicalismos de um lado, também há abertura para uma série para um canal estatal, como é o caso de O Ninho

É um caso complicado. Como falamos ano passado, há um “empoderamento” das minorias e uma luta constante por direitos iguais, mas os radicais conservadores estão tomando maior espaço na política. Ficamos muito felizes quando fomos agraciados no edital de séries para justamente ocupar o espaço da televisão estatal e confrontar outras ideias. O feedback foi muito “bacana”.

Vocês já podem adiantar algo sobre o vosso próximo projeto para cinema? O grande currículo de Beira-Mar vos incomoda no sentido das expectativas que podem gerar?

Nossa segunda longa-metragem se chama Garoto Neon e fala sobre um rapaz muito tímido e introspetivo que vive uma vida completamente oposta na internet. Não nos preocupamos em pensar sobre Beira-Mar no sentido das espectativas. O que gostamos é de analisar o que nos interessou trabalhar no filme anterior, o que gostaríamos de abordar, estética e narrativamente, que ainda não fizemos. Cada filme é um filme e nos dedicamos para que, isoladamente, cada um tenha a carreira mais “bacana” possível.

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