Sexta-feira, 29 Março

Mamã: O Mito do amor materno

 

 

A filósofa francesa Elizabeth Badinter lançou o caos na década de 80 do século passado quando publicou a controversa tese de que o famoso “instinto maternal” não passava de uma fantasia produzida pela ancestral cultura masculina. Ou seja, o amor materno não passava de um mito. 
 
O que um singelo filme de terror tem a ver com controvérsias académicas? Bom, o grande achado desta obra, em outros aspetos repletos dos clichés do género, é o “duelo maternal” travado entre uma obstinada “entidade” sobrenatural e uma pouco afetiva mãe por obrigação que cairia bem na tese de Badinter – a Annabel de Jessica Chastain.
 
Tudo começa com duas crianças levadas pelo pai para uma floresta em circunstâncias desesperadas. O seu desaparecimento súbito, no entanto, deixa as meninas órfãs e abandonadas. O tio delas, por sua vez, nunca desiste de procura-las e, cinco anos depois, as encontra… Ocorre que a sua nova “mamã”, que as ajudou sobreviver nestes tempos difíceis, não está disposta a perder as suas “filhas”… Pior para a outra mãe adotiva, que pela fidelidade ao namorado vai largar a sua banda de rock e sua vida “descontraída” para ajudá-lo na missão de reeducar as crianças – então reduzidas à selvageria. Tarefa que se revelará das mais inglórias…
 
Apesar do belo registo de Chastain num papel bastante diferente do habitual, é, no entanto, a “mamã” sobrenatural a roubar o filme, conseguindo provar que o cinema de terror explícito ainda consegue surpreender. Por outras palavras, desde que Linda Blair imortalizou “O Exorcista” naquela sensacional descida nas escadas “virada do avesso” que o uso de figuras “retorcidas” não causava tanto impacto. A cena em que ele persegue as suas “filhas” no corredor merece entrar para a antologia dos mais aterrorizantes momentos do género nos últimos tempos. 
 
 
Andrés e Barbara Muschietti, realizador e produtora de «Mamã»
 
Mas o clássico dos anos 70 não é a fonte de inspiração para o realizador Andrés Muschietti, conforme revelou ao C7nema (ver entrevista), mas sim os quadros do pintor modernista Amadeo Modigliani, cujas famosas figuras alongadas causaram sensação no início do século XX. “…a cara da Mamã e a forma como ela olha tem muito a  ver com os retratos feitos por Modigliani . A cara alongada, os olhos vazios, o pescoço longo e torto. Quando eramos miúdos tínhamos uma cópia de um trabalho do Modigliani na nossa casa e assustava-me imenso. Eu sempre temi esse tipo de retratos dele e pensei, porque não? Porque não pegar nessa cara horrível e dar a esta personagem?”, observou.
 
Sensação também causou o filme entre o público: com um custo modesto (U$ 15 milhões), essa co-produção entre Espanha e Canadá, com Guillelmo del Toro nos bastidores, já rendeu mais de U$ 100 milhões ao redor do mundo. “Mamã” também foi escolhido o melhor filme da última edição do Fantasporto. 
 
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Realização: Andres Muschietti.
Jessica Chastain, Nikolaj Coster-Waldau, Megan Charpentier, Isabelle Nélisse, Daniel Kash. Espanha/Canadá, 2013. {/xtypo_rounded2} 
 

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