Sexta-feira, 19 Abril

«Chevalier» por Hugo Gomes

Eis uma obra que coloca à prova a masculinidade, a sua natureza e a razão de tremenda existência. Hoje visto como um forçado sinónimo ao machismo, sexismo ou até homofobia, a masculinidade é um ato de afirmação de um homem perante os outros. O respeito, a dignidade, o exemplo de ser um individuo à altura de tal representação, tudo fragmentos que compõem o ego do género masculino. 
 
Chevalier incendeia essa mesma capa, esse estatuto de cobiça alcançável, ao mesmo tempo que atribui o seu quê de misticismo, pois, a masculinidade é um mito, e tais lendas são exorcizadas por Athina Rachel Tsangari. (sim, uma mulher a dirigir um filme onde não existe réstia presencial do lado feminino). A realizadora havia concretizado em 2010, o singular Attenberg [ler crítica], um filme de duas raparigas assexuadas em busca da sua própria identidade, em Chevalier, a jornada não é exclusivamente identitária, mas sim social, o regresso ao nosso lado animalesco, onde ansiamos cumprir os requisitos de macho alfa.
 
Contudo, mesmo sendo uma “ela” a apresentar este caricato enredo de um grupo de amigos, ou “camaradas” (a camaradagem é também ela uma manifestação da tão referida masculinidade), adeptos de pesca submarina que decidem jogar um prolongado jogo de competição, Chevalier (= Cavaleiro), onde o objetivo é avaliar individualmente cada um para eleger o mais “cavaleiros dos cavaleiros”, este é sobretudo um filme que transpira a “mão masculina” em todo os esporos.
 
Tal como fizera o brasileiro Gabriel Mascaro, em Boi Neon [ler crítica], a respetiva masculinidade é desconstruída, neste caso, a comédia bromance serve de veiculo para essa análise. A sátira de Chevalier é leve, mas eficaz, o ridículo é interiorizado no realismo das situações e nunca expande para o modo spoof nem sequer das comédias tresloucadas ao dispor do burlesco.
 
Os desempenhos funcionam na sua perfeita harmonia, visto que os atores se voluntariam como “cobaias” na própria teorização das respetivas essências de homem. Adereços que tornam o filme numa proposta imperdoável. Por isso, fica o aviso, quem não o vir – menos 10 pontos. Não percebeu? Menos 10.
 
 
O melhor – analisa, desconstrói e satiriza a masculinidade, “plus” é um filme dirigido por uma mulher
O pior – ser visto como uma somente comédia buddy
 
Hugo Gomes
 

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