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Preferimos mesmo cães a chineses? Uma reflexão/provocação às distribuidoras

Fim de semana de 10 a 12 de Agosto. Dog Days falha o top 10 de filmes mais vistos dos Estados Unidos com uma média mísera de pouco mais de mil dólares por cinema. Acaba por faturar apenas 6,8 milhões de dólares no total do seu percurso comercial lá. Estreia esta quinta-feira nas salas de cinema portuguesas. 

Fim de semana seguinte (17 a 19 de agosto): Crazy Rich Asians ocupa o primeiro posto, com uma média de faturação por sala quase 8 vezes superior. Sai dos cinemas norte-americanos com 174 milhões de dólares. Por cá, saiu há umas semanas atrás direto para os videoclubes, sem passagem comercial pelas salas de cinema nacionais. Porquê? Ordens da própria Warner Bros., que terá algures no tempo tomado a decisão, com base nalgum padrão comportamental, que preferimos ver uma enésima “dramédia” de domingo à tarde com cães do que uma enésima comédia romântica com chineses (com o bónus deste último, o mesmo que foi direto para um catálogo digital, o equivalente às prateleiras empoeiradas de antigamente, ter saído com muito melhores críticas lá fora – o facto de ser pioneiro pesou certamente nos julgamentos). Será que preferimos mesmo cães a chineses? 

Em primeiro lugar, convém salientar que falamos de dois filmes a) de distribuidoras completamente diferentes, logo com sistemas de apoio à decisão distintos; b) com a mesma qualidade duvidosa, embora o hype de Crazy Rich Asians seja bem mais ensurdecedor (potencial nomeado aos Oscar até, dada a popularidade atingida nos últimos meses). 

Crazy Rich Asians [1], fala, tal como o filme anuncia no seu título, de asiáticos endinheirados – aqueles que vivem a fazer negócios milionários de imobiliárias. Não existirá um público assim em Portugal, ou a distribuidora temeu que o filme não saísse deste ghetto e falasse à burguesia branca nacional? 

É fácil gostar de cães. Mas deve o mercado aceitar tudo o que tenha estes animais de quatro patas, que inclui sim um flop de todo o tamanho (comercial, crítico) como Dog Days? Quantas vezes vimos estas histórias intercruzadas, das maneiras mais embaraçosas, para se ser simpático?  

Fica então a questão do título para reflexão.

Fica fácil gritar racismo, com certeza, mas se pensarmos bem, não há racismo sem uma decisão capitalista por detrás. E sim, alguém pensou que não queríamos de todo ver chineses, e outra pessoa diferente pensou “todo o mundo gosta de cães” – se não estrearmos este filme, não é que estejamos necessariamente a tomar uma decisão política (embora toda a decisão que envolva meios de distribuição cultural, e acessibilidade, acaba por se tornar uma!) de não gostarmos de cães. Mas alguém continua a pensar que está a perder dinheiro se não o fizer. Cabe ao espectador (ativista) mostrar que há espaço também para querer ver um elenco principal só com chineses e descendentes de segunda geração, mesmo que o filme seja tão genérico como o que está a passar na sala ao lado com americanos descendentes de europeus…