Sexta-feira, 29 Março

Espantados, os espectadores recebem com aplausos os “Caminhos Magnétykos” de Edgar Pêra

“O Dinheiro Não é Tudo”

Edgar Pêra merece estar feliz. Não só não houve qualquer problema na projeção da sessão especial no Lisbon & Film Festival do seu novo filme, Caminhos Magnétykos, como o vasto público presente no Espaço Nimas, na noite passada (22/11), aplaudiu com vigor a fita no final da sessão. Com o cineasta na sala estiveram também o produtor Rodrigo Areias e o protagonista, Dominique Pinon, famoso por filmes como Delicatessen ou Amélie. Paulo Pires também marcou presença, mas deixou para o trio uma conversa com o público no final da sessão.

Em 2015, numa conversa com a Lusa, Pêra descreveu o seu filme como “pós-apocalíptico” numa Lisboa em Guerra Civil, mas nada nos faria esperar o que assistimos nesta nova adaptação de uma obra do autor Branquinho da Fonseca (com o pseudónimo António Madeira), autor do qual o cineasta já tinha adaptado Rio Turvo em 2007 e O Barão em 2011. O próprio admitiu que desde as primeiras ideias, até à sua execução, muita coisa mudou. Uma dos conceitos iniciais era apresentar campos de refugiados na Europa, mas na altura pensou-se que isso seria demais, explicou Rodrigo Areias, que consternado admite que infelizmente esses campos tornaram-se uma realidade. 

A ficção científica tornou-se real

No centro de toda a ação da fita está Raymond (Pinon), um parisiense que veio para Portugal com o 25 Abril, apaixonou-se e ficou, onde reside há 40 anos. Vivendo na dependência económica da sua mulher Gertrudes, que constantemente o chama de sapo, Raymond prepara-se para casar a sua filha de 21 anos, Catarina (Alba Baptista a confirmar talento depois de “Leviano“), com Damião (Paulo Pires exemplar), um homem rico e um influente nome no governo, ao ponto do primeiro ministro visitar a boda. É nessa noite e após a união que Raymond irá experienciar uma revolta interior e uma viagem “pesadélica” como Edgar Pêra o descreveu, que o coloca mesmo no “centro de uma conspiração astral“, onde nem Ney Matogrosso falta.

Para além de ser uma viagem profundamente sensorial à mente de Raymond e à de um novo (velho) país, Caminhos Magnétykos é uma ácida crítica aos tempos que correm, ao regresso dos fascismos, do controle (pela cidade de Lisboa, um drone avisa as pessoas sobre o recolher obrigatório). Nem Donald Trump escapa nesta caminhada, como também algumas figuras nacionais, cujas citações ao longo da sua carreira política foram incluídas no guião, provocando vários risos espontâneos durante a exibição.

Curiosamente, o próprio Pêra fez uma autocritica ao seu trabalho, de certa forma lamentando a cena em que Donald Trump liga a Damião (que se pode ver no trailer abaixo). Evocando Slavoj Žižek, Pêra contou uma anedota cuja mensagem estava ligada ao facto de fazermos piadas sobre banalidades em torno de Trump, quando simultaneamente ele nos vai violando com ações bem mais sérias e muito graves.

A acompanhar esta viagem caledescópica, temos uma banda sonora fulminante de acordes “magnéticos” a cargo The Legendary Tigerman, o que tudo misturado e embaralhado por uma montagem absolutamente hipnótica resulta num dos melhores trabalhos do cineasta nos últimos anos. Definitivamente,  Pêra e Branquinho são um casamento de sonho. 

Com estreia comercial agendada para janeiro, Caminhos Magnétykos é assim um filme para colocar na  agenda. Pinon estava “siderado” com o que acabava de ver (pela primeira vez) na sala. Nós também…

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