Terça-feira, 19 Março

Os Produtores – Ep 10: Para Além da Fúria do Guerreiro

Caros leitores,

De forma a celebrar o 10º artigo em que vos partilho o mundo real da 8ª arte, irei contar a bonita história de um idoso. Aos que apontam desde já uma gralha no primeiro parágrafo, o Cinema é, na realidade, a 8ª arte. No século XVII houve um senhor talhante de bigode farto em Albacete que popularizou o arroto de tal forma que foi considerado uma arte. Mas o lobby de Hollywood queimou todas as provas e fabricou uns contos sobre uns irmãos com tempo livre que desejavam uma forma mais divertida para ver pornografia e assim nasceu o Cinema tal como o conhecemos, sendo que a 7ª arte é uma mentira por questões de marketing. Souberam aqui primeiro.

Num pequeno cabeleireiro em Fleet Street, os irmãos Warner, Celso e Fannan,  penteiam-se com a ajuda de um John Travolta à solta.

John Travolta- Como de costume meus Senhores?

Produtor Fannan- Como de costume Sr. Travolta.

John Travolta- Com ou sem gel no final?

Produtor Celso- Receio que não tenhamos tempo, infelizmente.

Produtor Fannan- Ó Celso, já viste a nova coleção de filmes que vai sair no Público?

Produtor Celso- Não, é o quê?

Produtor Fannan- “Filmes que não envolveram assédios sexuais pela produção“. Huh, há uma estranha ausência de filmes nomeados a Óscares.

Produtor Celso- Eu lá tenho espaço agora para pôr todos os 12 filmes na prateleira. Olha se vendessem a coleção do Spaced é que era!

Produtor Fannan- Pelos vistos é só um filme: Gigli. Um bocado exagerado o termo ‘coleção’.

Produtor Celso- Esse não é aquele do Ben Affleck?

Produtor Fannan- Há mais algum Gigli?

Produtor Celso- Não mas se calhar era hora de fazerem um remake. Não está mau. A ver se falo com o senhor do quiosque para comprar só o DVD.

Quando se ouve o sino da porta a tocar, os irmãos Warner reparam num idoso à entrada

Senhor de Terceira Idade- Muito bom dia.

Produtor Celso- Georgie! Também vens ao Travolta?

George- Não, o Travolta é que vem a mim.

Os quatros suspeitos do costume riem-se imenso

Produtor Fannan- Este George! Olha, sempre é para avançar com o filme?

George- Hmm, não sei…

Produtor Celso- Ah! Anda lá George!

George- Eu não consigo dizer-vos que não!

John Travolta- Ah, ah, ah! Não sem antes vermos esses cocurutos!

Todos em coro: Sr. Travolta!!!

Voltam todos a rir e os créditos passam. De facto, a história podia acabar aqui, mas tal como nos cabeleireiros Travolta, os finais felizes são só para quem merece e o velhote George lutou muito por ele.

Nos velhinhos anos 80, a década onde o mundo admirava o bigode farto de António Sala, George faz um filme, sequela de seu conto original, onde conta a história da 2ª Circular. O sucesso foi notório, inspirando inúmeras produções futuras. A demanda por um terceiro capítulo justificou a aposta do estúdio, porém, a tramada maldição do terceiro filme deixa um mau gosto na boca dos espectadores. Foram tempos difíceis em que o pequeno George tentou convencer que ainda tinha mais para dar.

Nos estúdios da Warner, ali em Santa Apolónia:

Produtor Celso- Ah!, vem-me lá agora convencer disso!

Produtor Fannan- Estou-te a dizer! O Michael Jackson tem imenso jeito com as crianças!

Produtor Celso- Ele é uma vedeta! Quer lá agora saber de crianças! Nem olha para elas. O dinheiro cega as pessoas Fannan! Ouve o que eu te digo!

Entra o, na altura, jovem George.

George- Muito boa tarde Senhores Warner.

Produtor Celso- Epá ó George ainda bem que chegaste, precisamos de falar.

George- Então?

Produtor Celso- Ó George, como é que eu digo isto sem ser muito frio. Hmm. É assim, não dá mais George.

George- Mas o quê?

Produtor Celso- Devias voltar para a tua terra e voltar a dedicar-te à produção de Vegimite, seja lá o que isso seja. Chega de filmes. Este último foi péssimo e matou qualquer esperança de continuar a franquia.

George- Mas abriu tantas portas ao conceito.

Produtor Fannan- Sim mas a partir do momento que apresentas a Tina Turner estragas tudo George, não dá.

Estagiário a lavar o chão com a própria camisa- Eu achei que a Tina Turner esteve bem, na minha opinião. Gostei dela.

Produtor Fannan- Isso é porque tu confundes gostar com estar despedido.

George- Mas eu posso tentar outra vez! Agora faço melhor, prometo!

Produtor Celso- Não, epá, ó George, nós em Hollywood não fazemos filmes pelo dinheiro. Temos de saber quando parar e neste momento tu estragaste tudo. A única coisa que se salva é o Mel Gibson pois ele é intocável e é impossível arruinar a imagem dele.

George- Mas, por favor, eu sou capaz! Não me tirem o cinema! Eu não quero voltar para a Austrália! Lá os preços do entretenimento têm o tamanho proporcional às aranhas!

Produtor Fannan- Epá ó Celso, há de haver alguma coisa que possamos dar ao George! Ele é tão querido! Olha aquelas bochechas!

Produtor Celso- Ó Fannan eu não sei, nós agora temos que nos focar no Tim Burton. Temos de lhe tirar a ideia de usar o Michael Keaton como Batman se queremos ser levados a sério.

George- Não sei, olhem que fazer comédia é difícil, não é para qualquer ator. Eu, pessoalmente, acho que o Michael Keaton é um ator bastante versátil. É uma escolha inspirada. No meu ponto de vista.

Produtor Celso- Ó George, com todo o respeito, deixa o trabalho de produtor para quem sabe, está bem?

George- Até parece que o vosso trabalho é difícil.

Produtor Fannan- Ai achas que é fácil? Achas que é simples fazer bons filmes a partir de porcaria?

Produtor Celso- Queres trabalho né? Então fazemos assim: nós damos-te um budget para fazeres sucesso com um filme sobre um porco. Pode ser a história que quiseres. Agora pegas nisso e fazes um clássico. Depois falamos, quando vieres a chorar em posição fetal por não saberes como vender aquilo.

George- Tá certo, posso começar para a semana?

Produtor Fannan- Erm, sim…

George- Ok, té já então.

O pequeno George saiu da grande cidade e foi criar a emocionante história sobre um leitão da Bairrada que era desejado por um restaurante que preparava um casamento. O filme chamou-se ‘Babe: Porco no Espeto’ e fez a alegria das crianças e graúdos. O sucesso foi tal que justificou ter feito a sequela ‘Babe: Enchidos e Fumados’, terminando uma década de 90 memorável, não sem a ajuda de José Figueiras e as suas jardineiras.

Foi então na década de 2000, quando a SIC foi à rua pôr o lixo e sem querer levou o Herman no saco, que o já velhinho George tentou uma vez mais continuar o seu ‘franchise’.

Produtor Celso- Já disse que não!

Produtor Fannan- Epá vá lá!

Produtor Celso- Não vamos investir em super-heróis! Isso não dá dinheiro!

Produtor Fannan- Então mas tu não viste o rio de dinheiro que fez o Spider-man?

Produtor Celso- Isso foi sorte, as pessoas queriam ver se eles tinham posto a cena das torres gémeas no filme ou não!

Produtor Fannan- Mas e se tentarmos? Porque não fazemos um filme do Batman?

Produtor Celso- Tás parvo? O que achas que vão dizer os nossos investidores depois de anunciarmos que vamos fazer mais um filme depois do Batman & Robin?

Produtor Fannan- Mas está lá fora uma criança sobrevalorizada que gostava de falar sobre uma adaptação realista do filme…

Produtor Celso- Ai agora vamos fazer um Batman realista? Oh Fannan, poupa-me! ‘Tá bem? Poupa-me!

É aqui que entra George

George- Muito bom dia Senhores Warner.

Produtor Fannan- Lá vamos nós…

Produtor Celso- Ó George desculpa mas hoje não vai dar.

George- Mas porquê? Eu fiz não um mais dois filmes com porcos! Eu provei que tenho o que é preciso para fazer um bom trabalho! Deixei-me lá fazer o quarto filme!

Produtor Fannan- Ó George, o que é que tu sabes da Justice League?

George- Tenho que pensar…

Produtor Celso- Fannan, não!

George- Já pensei. Por mim pode ser, tenho até já aqui uns esboços que fiz enquanto o Sr. Celso interrompia o Sr. Fannan.

Produtor Fannan- Eish, olha isto Celso, parece incrível!

Produtor Celso- Epá não! Fannan, não há filmes de super-heróis para ninguém! E tu George, já te dissemos que não vamos fazer o quarto filme!

George- Mas o que preciso fazer mais?

Produtor Fannan- Vá lá Celso, dá-lhe qualquer coisa, ele é tão querido! Olha aquelas bochechas!

Produtor Celso- Está bem, queres fazer um filme? Então agora prova que és capaz de fazer sucesso com um sobre pinguins! Se conseguires, fazemos a porcaria do quarto filme.

George- Tou, Elijah? Sou eu. Sim, olha, tás de folga em que dia desta semana? Quinta? Ok. Não, tenho um filme para ti. Sim. Ok. Então vá, xau. Não, no El Corte Inglés. Tá. Xau. *desliga o telemóvel* Desculpem, estava a fazer um casting. Combinado então, té já.

E assim o velhote George fez um filme chamado ‘Happy Feet: Do Gelo para o Convento’ onde um pequeno pinguim tinha o sonho de deixar os pais num lar da Santa Casa e seguir uma carreira como freira no Convento de Mafra. As ovações ao filme foram soberbas e George lançou pouco tempo depois a aguardada sequela ‘Happy Feet Two: Electric Pingualoo’ onde o pequeno pinguim suicida-se com uma gilete e jorra sangue pela traqueia durante 3 horas. Os miúdos adoraram e a McDonald’s faturou muito com os bonecos do Happy Meal.

Foi então que, no inicio da década de 2010…

Produtor Fannan- Eu não te disse que isto dos universos partilhados dava dinheiro? Olha aqui esta critica do Hugo Gomes no C7NEMA:

“(…)E é por isto que eu considero que Iron Man 2 é um filme indispensável e volta, uma vez mais, a comprovar que a Marvel é o estúdio de cinema mais importante a agraciar as nossas salas. Assim, sim, vale a pena amar cinema! 5 estrelas em 5

Produtor Celso- Epá tá bem mas ainda é possível convencermos o Nolan a meter o Super-Homem no Batman 3.

Produtor Fannan- Achas que ele vai nisso? Depois de tanto trabalho a vender a ideia como realista?

Produtor Celso- Não sei, pode fazer com que o Super-Homem seja um judoca que nos tempos livres voe num Helicóptero chamado Super e faça resgates. Não sei, são ideias. O que queres que faça? Continuamos sem ele?

Produtor Fannan- Então e se começarmos já com o Super-Homem-..

Produtor Celso- Mas-…

Produtor Fannan- Espera! Super-Homem mas realizado pelo… huuh.. olha, Zack Snyder!

Produtor Celso- Hmm.. realmente a crítica tende a gostar dele…

Produtor Fannan- Vês?

George, o cineasta sénior, entra na sala.

George- Pronto, já fiz dois não um mas dois filmes com porcos e com pinguins. Posso, de uma vez por todas, fazer o filme que quero?

Produtor Celso- Epá sim, pronto, faz lá aquilo que tu quiseres, nós agora estamos aqui com umas ideias sobre uns universos. Vai lá, usa este cartão refeição e filma o que quiseres. Vá.

E assim, George realizou Mad Max: Fury Road, a incrível história de como os condutores não respeitam os peões e não sabem conduzir em rotundas, tudo filmado na Margem Sul. Não foi possível filmar com Mel Gibson por este estar cheio de projetos que Hollywood lhe atira, mas George, o velhinho, criou uma lenda em 2015 com o primeiro filme que ganhou o Óscar de melhor filme em três anos consecutivos.

A Warner não hesitou naquele dia em dar luz verde para que George Miller avançasse com Mad Max: The Wasteland, a história que conta a origem do trânsito na IC19, tendo sido um mítico contracto assinado nos cabeleireiros Travolta.

E esta foi a lenda de George Miller, o velhinho que já ninguém dava nada por ele, até mostrar que qualquer filme na história do cinema tal como o conhecemos melhora significativamente quando se acrescenta uma guitarra que lança chamas.

Só nunca chegámos a saber se houve algum final feliz para John Travolta. Mas tal como um bom final, fica para a imaginação de todos nós.

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